quinta-feira, 28 de outubro de 2010
Constituições Apostólicas
Fidei Depositum
Constituição Apostólica
FIDEI DEPOSITUM
para a publicação do
Catecismo da Igreja Católica
redigido depois do Concílio Vaticano II
JOÃO PAULO II, BISPO
Servo dos Servos de Deus
para perpétua memória
I. INTRODUÇÃO
Guardar o Depósito da Fé é missão que o Senhor confiou à sua Igreja e que ela cumpre em todos os tempos. O Concílio Ecuménico Vaticano II, inaugurado há trinta anos pelo meu predecessor João XXIII, de feliz memória, tinha como intenção e como finalidade pôr em evidência a missão apostólica e pastoral da Igreja, e, fazendo resplandecer a verdade do Evangelho, levar todos os homens a procurarem e acolherem o amor de Cristo que excede toda a ciência (cf. Ef 3,19).
Ao Concílio, o Papa João XXIII tinha confiado como tarefa principal guardar e apresentar melhor o precioso depósito da doutrina cristã, para o tornar mais acessível aos fiéis de Cristo e a todos os homens de boa vontade. Portanto, o Concílio não devia, em primeiro lugar, condenar os erros da época, mas sobretudo empenhar-se por mostrar serenamente a força e a beleza da doutrina da fé. "Iluminada pela luz deste Concílio - dizia o Papa - a Igreja... crescerá em riquezas espirituais... e, recebendo a força de novas energias, olhará intrépida para o futuro... É nosso dever... dedicar-nos, com vontade pronta e sem temor, àquele trabalho que o nosso tempo exige, prosseguindo assim o caminho que a Igreja percorre há vinte séculos"1.
Com a ajuda de Deus, os Padres conciliares puderam elaborar, em quatro anos de trabalho, um conjunto considerável de exposições doutrinais e de directrizes pastorais oferecidas a toda a Igreja. Pastores e fiéis encontram ali orientações para aquela "renovação de pensamentos, de actividades, de costumes, e de força moral, de alegria e de esperança, que foi o objectivo do Concílio"2.
Depois da sua conclusão, o Concílio não cessou de inspirar a vida da Igreja. Em 1985 pude afirmar: "Para mim - que tive a graça especial de nele participar e colaborar no seu desenvolvimento - o Vaticano II foi sempre, e é de modo particular nestes anos do meu Pontificado, o constante ponto de referência de toda a minha acção pastoral, no consciente empenho de traduzir as suas directrizes em aplicação concreta e fiel, a nível de cada Igreja e da Igreja inteira. É preciso incessantemente recomeçar daquela fonte"3.
Neste espírito, a 25 de Janeiro de 1985, convoquei uma Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, por ocasião do vigésimo aniversário do encerramento do Concilio. A finalidade desta Assembleia era celebrar as graças e os frutos espirituais do Concílio Vaticano II, aprofundar o seu ensinamento para aderir melhor a ele e promover o conhecimento e a aplicação do mesmo.
Nessa ocasião, os Padres sinodais afirmaram: "Muitíssimos expressaram o desejo de que seja composto um Catecismo ou compêndio de toda a doutrina católica, tanto em matéria de fé como de moral, para que ele seja como um ponto de referência para os catecismos ou compêndios que venham a ser preparados nas diversas regiões. A apresentação da doutrina deve ser bíblica e litúrgica, oferecendo ao mesmo tempo uma doutrina sã e adaptada à vida actual dos cristãos"4. Depois do encerramento do Sínodo, fiz meu este desejo, considerando que ele "corresponde à verdadeira necessidade da Igreja universal e das Igrejas particulares"5.
Como não havemos de agradecer de todo o coração ao Senhor, neste dia em que podemos oferecer a toda a Igreja, com o título de "Catecismo da Igreja Católica", este "texto de referência" para uma catequese renovada nas fontes vivas da fé!
Depois da renovação da Liturgia e da nova codificação do Direito Canónico da Igreja Latina e dos cânones das Igrejas Orientais Católicas, este Catecismo trará um contributo muito importante àquela obra de renovação da vida eclesial inteira, querida e iniciada pelo Concílio Vaticano II.
II. ITINERÁRIO E ESPÍRITO DA REDAÇÃO DO TEXTO
O "Catecismo da Igreja Católica" é fruto de uma vastíssima colaboração: foi elaborado em seis anos de intenso trabalho, conduzido num espírito de atenta abertura e com apaixonado ardor.
Em 1986, confiei a uma Comissão de doze Cardeais e Bispos, presidida pelo senhor Cardeal Joseph Ratzinger, o encargo de preparar um projecto para o Catecismo requerido pelos Padres do Sínodo. Uma Comissão de redacção, composta por sete Bispos diocesanos, peritos em teologia e em catequese, coadjuvou a Comissão no seu trabalho.
A Comissão, encarregada de dar as directrizes e de vigiar sobre o desenvolvimento dos trabalhos, seguiu atentamente todas as etapas da redacção das nove sucessivas composições. A Comissão de redacção, por seu lado, assumiu a responsabilidade de escrever o texto e lhe inserir as modificações pedidas pela Comissão e de examinar as observações de numerosos teólogos, exegetas e catequistas, e sobretudo dos Bispos do mundo inteiro, a fim de melhorar o texto. A Comissão foi sede de intercâmbios frutuosos e enriquecedores, para assegurar a unidade e a homogeneidade do texto.
O projecto tornou-se objecto de vasta consultação de todos os Bispos católicos, das suas Conferências Episcopais ou dos seus Sínodos, dos Institutos de teologia e de catequética. No seu conjunto, ele teve um acolhimento amplamente favorável da parte do Episcopado. É justo afirmar que este Catecismo é o fruto de uma colaboração de todo o Episcopado da Igreja Católica, o qual acolheu com generosidade o meu convite a assumir a própria parte de responsabilidade numa iniciativa que diz respeito, intimamente, à vida eclesial. Tal resposta suscita em mim um profundo sentimento de alegria, porque o concurso de tantas vozes exprime verdadeiramente aquela a que se pode chamar a "sinfonia" da fé. A realização deste Catecismo reflecte, deste modo, a natureza colegial do Episcopado: testemunha a catolicidade da Igreja.
III. DISTRIBUIÇÃO DA MATÉRIA
Um catecismo deve apresentar, com fidelidade e de modo orgânico, o ensinamento da Sagrada Escritura, da Tradição viva na Igreja e do Magistério autêntico, bem como a herança espiritual dos Padres, dos Santos e das Santas da Igreja, para permitir conhecer melhor o mistério cristão e reavivar a fé do povo de Deus. Deve ter em conta as explicitações da doutrina que, no decurso dos tempos, o Espírito Santo sugeriu à Igreja.
É também necessário que ajude a iluminar, com a luz da fé, as novas situações e os problemas que ainda não tinham surgido no passado.
O Catecismo incluirá, portanto, coisas novas e velhas (cf. Mt 13,52), porque a fé é sempre a mesma e simultaneamente é fonte de luzes sempre novas.
Para responder a esta dupla exigência, o "Catecismo da Igreja Católica" por um lado retoma a "antiga" ordem, a tradicional, já seguida pelo Catecismo de São Pio V, articulando o conteúdo em quatro partes: o Credo; a sagrada Liturgia, com os sacramentos em primeiro plano; o agir cristão, exposto a partir dos mandamentos; e por fim a oração cristã. Mas, ao mesmo tempo, o conteúdo é com frequência expresso de um modo "novo", para responder às interrogações da nossa época.
As quatro partes estão ligadas entre si: o mistério cristão é o objecto da fé (primeira parte); é celebrado e comunicado nos actos litúrgicos (segunda parte); está presente para iluminar e amparar os filhos de Deus no seu agir (terceira parte); funda a nossa oração, cuja expressão privilegiada é o "Pai-Nosso", e constitui o objecto da nossa súplica, do nosso louvor e da nossa intercessão (quarta parte).
A Liturgia é ela própria oração; a confissão da fé encontra o seu justo lugar na celebração do culto. A graça, fruto dos sacramentos, é a condição insubstituível do agir cristão, tal como a participação na liturgia da Igreja requer a fé. Se a fé não se desenvolve nas obras, essa está morta (cf. Tg 2,14-16) e não pode dar frutos de vida eterna.
Lendo o "Catecismo da Igreja Católica", pode-se captar a maravilhosa unidade do mistério de Deus, do seu desígnio de salvação, bem como a centralidade de Jesus Cristo, o Filho Unigénito de Deus, enviado pelo Pai, feito homem no seio da Santíssima Virgem Maria por obra do Espírito Santo, para ser o nosso Salvador. Morto e ressuscitado, ele está sempre presente na sua Igreja, particularmente nos sacramentos; ele é a fonte da fé, o modelo do agir cristão e o Mestre da nossa oração.
IV. VALOR DOUTRINAL DO TEXTO
O "Catecismo da Igreja Católica", que aprovei no passado dia 25 de Junho e cuja publicação hoje ordeno em virtude da autoridade apostólica, é uma exposição da fé da Igreja e da doutrina católica, testemunhadas ou iluminadas pela Sagrada Escritura, pela Tradição apostólica e pelo Magistério da Igreja. Vejo-o como um instrumento válido e legítimo a serviço da comunhão eclesial e como uma norma segura para o ensino da fé. Sirva ele para a renovação, à qual o Espírito Santo chama incessantemente a Igreja de Deus, Corpo de Cristo, peregrina rumo à luz sem sombras do Reino!
A aprovação e a publicação do "Catecismo da Igreja Católica" constituem um serviço que o Sucessor de Pedro quer prestar à Santa Igreja Católica, a todas as Igrejas particulares em paz e em comunhão com a Sé Apostólica de Roma: o serviço de sustentar e confirmar a fé de todos os discípulos do Senhor Jesus (cf. Lc 22,32), como também de reforçar os laços da unidade na mesma fé apostólica.
Peço, portanto, aos Pastores da Igreja e aos fiéis que acolham este Catecismo em espírito de comunhão, e que o usem assiduamente ao cumprirem a sua missão de anunciar a fé e de apelar para a vida evangélica. Este Catecismo lhes é dado a fim de que sirva como texto de referência, seguro e autêntico, para o ensino da doutrina católica, e de modo muito particular para a elaboração dos catecismos locais. É também oferecido a todos os fiéis que desejam aprofundar o conhecimento das riquezas inexauríveis da salvação (cf. Jo 8,32). Pretende dar um apoio aos esforços ecuménicos animados pelo santo desejo da unidade de todos os cristãos, mostrando com exactidão o conteúdo e a harmoniosa coerência da fé católica. O "Catecismo da Igreja Católica", por fim, é oferecido a todo o homem que nos pergunte a razão da nossa esperança (cf. lPd 3,15) e queira conhecer aquilo em que a Igreja Católica crê.
Este Catecismo não se destina a substituir os Catecismos locais devidamente aprovados pelas autoridades eclesiásticas, os Bispos diocesanos e as Conferências Episcopais, sobretudo se receberam a aprovação da Sé Apostólica. Destina-se a encorajar e ajudar a redacção de novos catecismos locais, que tenham em conta as diversas situações e culturas, mas que conservam cuidadosamente a unidade da fé e a fidelidade à doutrina católica.
V. CONCLUSÃO
No final deste documento que apresenta o "Catecismo da Igreja Católica", peço a Santíssima Virgem Maria, Mãe do Verbo Encarnado e Mãe da Igreja, que ampare com a sua poderosa intercessão o empenho catequético da Igreja inteira a todos os níveis, nestes tempos em que ela é chamada a um novo esforço de evangelização. Possa a luz da verdadeira fé libertar a humanidade da ignorância e da escravidão do pecado, para a conduzir à única liberdade digna deste nome (cf. Jo 8,32): a da vida em Jesus Cristo sob a guia do Espírito Santo, na terra e no Reino dos Céus na plenitude da bem-aventurança da visão de Deus face à face (cf. 1Cor 13,12; 2Cor 5,6-8)!
Dado no dia 11 de Outubro de 1992, trigésimo aniversário da abertura do Concílio Ecuménico Vaticano II, décimo quarto ano do meu pontificado.
JOANNES PAULUS PP. II
REFERÊNCIAS
1João XXIII, Discurso de abertura do Concílio Ecuménico Vaticano II, 11 de Outubro de 1962: AAS 54 (1962), p. 788-791.
2Paulo VI, Discurso de encerramento do Concílio Ecuménico Vaticano II, 8 de Dezembro de 1965: AAS 58 (1966), p. 7-8.
3João Paulo II, Alocução de 25 de Janeiro de 1985: L'Osseruatore Romano, 27 de Janeiro de 1985.
4Relação Final do Sínodo Extraordináno, 7 de dezembro de 1985, II,B,a,n.4: Enchiridion Vaticanum, vol. 9, p. 1758, n. 1797.
5Discurso de encerramento do Sínodo Extraordinário, 7 de dezembro de 1985, n.6: AAS 78 (1986), p. 435
Missale Romanum
CONSTITUIÇÃO APOSTÓLICA
MISSALE ROMANUM
DE PAULO, BISPO,
SERVO DOS SERVOS DE DEUS,
PELA QUAL SE PROMULGA O MISSAL ROMANO,
RESTAURADO SEGUNDO O DECRETO
DO CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II,
PARA PERPÉTUA MEMÓRIA
O Missal Romano que, conforme o decreto do Concílio Tridentino, foi promulgado em 1570 pelo nosso predecessor São Pio V(1) conta-se entre os muitos e admiráveis frutos que aquele Santo Sínodo difundiu por toda a Igreja de Cristo. Na verdade, durante quatro séculos, os sacerdotes do rito latino o tiveram como norma para a celebração do sacrifício eucarístico, e os santos arautos do Evangelho o introduziram em quase toda a terra. Nele também muitos santos alimentaram copiosamente a sua piedade para com Deus, haurindo-a tanto das leituras da Sagrada Escritura como das suas orações, cuja parte principal fora organizada por São Gregório Magno.
Mas, desde que começou a crescer e a fortificar-se entre o povo cristão o desejo de promover a sagrada liturgia - desejo que, segundo a palavra do nosso predecessor de venerável memória Pio XII, deve ser considerado um sinal favorável da Divina Providência para com os homem do nosso tempo e uma passagem salutar do Espírito Santo pela sua Igreja (2) - tornou-se evidente que as fórmulas do missal Romano deviam ser restauradas e enriquecidas. O mesmo Pontífice deu início a esta obra, restaurando a Vigília Pascal(3) e o Ordinário da Semana Santa, que se tornou assim o primeiro passo para a adaptação do Missal Romano à nova mentalidade do nosso tempo.
Recentemente, porém, o Concílio Ecuménico Vaticano II, promulgando a Constituição que se inicia com as palavras "Sacrosanctum Concilium", lançou os fundamentos da reforma geral do Missal Romano: ele estabeleceu primeiramente que os textos e ritos sejam ordenados de modo a exprimirem mais claramente as realidades sagradas que significam(4); depois que o Ordinário da Missa seja revisto para manifestar melhor o sentido de cada uma de suas partes e a conexão entre elas, e para facilitar a participação piedosa e activa dos fiéis(5); que se prepare para os fiéis uma mesa mais abundante da Palavra de Deus, abrindo-lhes largamente os tesouros bíblicos(6); enfim, que se elabore o novo rito da concelebração a ser inserido no Pontifical e no Missal Romano(7).
Mas não se deve pensar que esta renovação do Missal Romano tenha sido feita de modo improvisado, pois o seu caminho foi preparado pelo progresso das disciplinas litúrgicas nos últimos quatro séculos. Se, de fato, após o Concílio Tridentino, o estudo dos antigos manuscritos da Biblioteca Vaticana e de outros recolhidos de toda parte, como se exprime a Constituição Apostólica "Quo Primum" de nosso predecessor São Pio V, muito contribuiu para a revisão do Missal Romano, de então para cá também foram descobertas e publicadas as mais antigas fontes litúrgicas e foram mais profundamente estudadas as fórmulas litúrgicas da Igreja Oriental. Assim muitos insistiram para que tais riquezas doutrinais e espirituais não permanecessem na obscuridade das bibliotecas, mas pelo contrário, fossem dadas à luz, para ilustrarem e nutrirem as mentes dos cristãos.
A seguir apresentamos em grandes traços a nova composição do Missal Romano. Em primeiro lugar temos a Instrução Geral que, como Proêmio do livro, expõe as novas normas para a celebração do Sacrifício Eucarístico, tanto em relação aos ritos e funções de cada participante, como às alfaias e lugares sagrados.
A principal novidade da reforma está na chamada Oração Eucarística. Embora, no rito romano, a primeira parte desta Oração - o Prefácio - tenha conhecido diversos formulários através dos séculos, a segunda parte, que é chamada o Cânon da Acção, conservou sempre a mesma forma que foi fixada entre os séculos IV e V. As liturgias orientais, pelo contrário, admitiam certa variedade nas suas Anáforas. Neste ponto, decidimos acrescentar ao Cânon Romano três novos formulários de Orações Eucarísticas, além de enriquecê-los com grande número de Prefácios, tirados da antiga tradição na Igreja Romana ou compostos agora, a fim de manifestar melhor os vários aspectos do mistério da fé, e oferecer mais numerosos e fecundos motivos de acção de graças. No entanto, por motivos de ordem pastoral e para facilitar a concelebração, estabelecemos que as palavras do Senhor sejam as mesmas em todos os formulários do Cânon. Assim, queremos que em cada Oração Eucarística se pronunciem as seguintes palavras: sobre o pão - "Accipite et manducate ex hoc omnes: Hoc est enim Corpus meum, quod pro vobis tradetur"; sobre o cálice - "Accipite et bibite ex eo omnes: Hic est enim calix Sanguinis mei novi et aeterni testamenti, qui pro vobis et pro multis effundetur in remissionem peccatorum. Hoc facite in meam commemorationem". A expressão "Mysterium fidei", tirada do contexto das palavras de Cristo e proferida pelo sacerdote, serve de preâmbulo à aclamação dos fiéis.
Quanto ao Ordinário da Missa, "as cerimonias foram simplificadas, conservando-se cuidadosamente a substância"(8). Deixou-se também de lado "tudo o que foi duplicado no decurso dos tempos ou acrescentado sem verdadeira utilidade"(9), sobretudo nos ritos da oblação do pão e do vinho, da fracção do pão e da comunhão.
Assim, "foram restaurados, segundo a primitiva ordem dos Santos Padres, alguns ritos que tinham caído em desuso"(10), tais como a homilia(11), a oração universal ou dos fiéis(12), e o rito penitencial ou de reconciliação com Deus e os irmãos no início da Missa, devidamente revalorizado.
Também segundo prescrição do Concílio Vaticano II, que mandava ler ao povo "dentro de um período determinado de anos as partes mais importantes da Sagrada Escritura"(13), todo o conjunto das leituras dominicais foi distribuído num período de três anos. Além disso, nos domingos e dias de festa, as leituras da Epístola e do Evangelho são precedidas de uma outra do Antigo Testamento ou, no Tempo Pascal, dos Actos dos Apóstolos. Desta forma aparece mais claramente o desenvolvimento do mistério da salvação, a partir das palavras reveladas. Essa tão grande riqueza de leituras bíblicas, que apresenta aos fiéis nos dias festivos a parte mais importante da Sagrada Escritura, é completada por outras partes dos Livros Santos lidos em dias não festivos.
Tudo isto foi assim ordenado para aumentar cada vez mais nos fiéis "a fome da Palavra de Deus"(14) que, sob a direcção do Espírito Santo, deve levar o povo da Nova Aliança à perfeita unidade da Igreja. Por estas determinações esperamos que tanto os sacerdotes como os fiéis venham a se preparar mais santamente para a Ceia do Senhor e, ao mesmo tempo, meditando de maneira mais profunda as Sagradas Escrituras, se alimentem sempre mais com as palavras do Senhor. Assim, conforme as exortações do Vaticano II, as Sagradas Escrituras se tornarão para todos uma fonte perene de vida espiritual, o meio precípuo para a transmissão da doutrina cristã e, por fim, como que a medula de toda a formação teológica.
Nesta reforma do Missal Romano, além das três mudanças acima citadas - a Oração Eucarística, o Ordinário da Missa e distribuição das Leituras - outras partes foram revistas e consideravelmente modificadas: o Temporal, o Santoral, o Comum dos Santos, as Missas Rituais e as Votivas. Merecem particular atenção as orações, não só aumentadas em número, para que novos textos correspondessem às necessidades de hoje, como restauradas, quando antigas, segundo os textos primitivos. Por isso, acrescentou-se uma oração própria para cada dia feriado dos principais tempos litúrgicos, ou seja, do Advento, do Natal, da Quaresma e da Páscoa.
Quanto ao mais, embora não se tenha mudado o texto do Gradual Romano para o canto, foram restaurados, conforme a conveniência, para melhor compreensão dos fiéis, tanto o Salmo Responsorial, a que muitas vezes se referem Santo Agostinho e São Leão Magno, como as antífonas para a entrada e para a comunhão nas Missas sem canto.
Por fim, queremos dar força de lei a tudo que até aqui expusemos sobre o novo Missal Romano. Nosso predecessor, São Pio V, promulgando a edição-príncipe do Missal Romano, apresentou-o ao povo cristão como factor da unidade litúrgica e sinal da pureza do culto da Igreja. Da mesma forma, nós, no novo Missal, embora deixando lugar para "legítimas variações e adaptações"(15), segundo as normas do Concílio Vaticano II, esperamos que seja recebido pelos fiéis como um meio de testemunhar e afirmar a unidade de todos, pois, entre tamanha diversidade de línguas, uma só e mesma oração, mais fragrante que o incenso, subirá ao Pai celeste por nosso Sumo Sacerdote Jesus Cristo, no Espírito Santo.
O que prescrevemos por esta nossa Constituição entrará em vigor este ano, a partir do dia 30 de Novembro, primeiro domingo do Advento.
Tudo o que aqui estabelecemos e ordenamos queremos que seja válido e eficaz, agora e no futuro, não obstante a qualquer coisa em contrário nas Constituições e Ordenações Apostólicas dos nossos predecessores, e outros estatutos, embora dignos de menção e derrogação especiais.
- Dado em Roma, junto de São Pedro, a 3 de Abril de 1969, quinta-feira da Ceia de Nosso Senhor Jesus Cristo, sexto ano do nosso pontificado.
Paulo VI, papa
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Referências:
(1) Const. Apost. "Quo Primum", de 14.07.1570.
(2) Cf. Pio XII, Alocução aos participantes do I Congresso Internacional de Pastoral Litúrgica de Assis, de 22.09.1956, AAS 48 (1956), p. 712.
(3) Cf. S.C.dos Ritos, Decreto geral "Dominicae Ressurrectionis", de 09.02.1951, AAS 43 (1951) pp. 128ss; Decreto geral "Maxima Redemptionis Nostrae Mysteria", de 16.11.1955, AAS 47 (1955), pp. 838ss.
(4) Conc. Vaticano II, Const. sobre a Sagrada Liturgia, "Sacrosanctum Concilium", nº 21, AAS 56 (1964), p. 106.
(5) Cf. ibid., nº 50, p. 114.
(6) Cf. ibid., nº 51, p. 114.
(7) Cf. ibid., nº 57, p. 115.
(8) Cf. ibid., nº 50, p. 114.
(9) Cf. ibid., nº 50, p. 114.
(10) Cf. ibid., nº 50, p. 114.
(11) Cf. ibid., nº 50, p. 114.
(12) Cf. ibid., nº 53, p. 114.
(13) Cf. ibid., nº 51, p. 114.
(14) Cf. Amós 8,11.
(15) Cf. Conc. Vaticano II, Const. sobre a Sagrada Liturgia, SC, nnº 38-40, AAS 56 (1964), p. 110.
Sacrae Disciplinae Leges
Constituição Apostólica
SACRAE DISCIPLINAE LEGES
sobre a Promulgação do Código de Direito Canónico [de 1983]
Aos veneráveis irmãos Cardeais,
Arcebispos, Bispos, Presbíteros, Diáconos
e demais Membros do Povo de Deus,
João Paulo Bispo,
Servo dos Servos de Deus,
para Perpétua Memória.
No decorrer dos tempos, a Igreja Católica costumou reformar e renovar as leis da disciplina canónica, a fim de, na fidelidade constante a seu Divino Fundador, adaptá-las à missão salvífica que lhe é confiada. Movido por esse mesmo propósito e realizando finalmente a expectativa de todo o mundo católico, determinamos, neste dia 25 de Janeiro de 1983, a publicação do Código de Direito Canónico já revisto. Ao fazê-lo, volta-se o nosso pensamento para o mesmo dia do ano de 1959, quando o nosso predecessor João XXIII, de feliz memória, anunciou pela primeira vez ter decidido reformar o Corpus vigente das leis canónicas, promulgado em 1917, na solenidade de Pentecostes.
Essa decisão de reformar o Código foi tomada juntamente com duas outras mencionadas na mesma data por aquele Pontífice: a intenção de realizar um Sínodo da Diocese de Roma e a de convocar um Concílio Ecuménico. Embora o primeiro desses eventos não tenha muita relação com a reforma do Código, o segundo, isto é, o Concílio, é de extrema importância para este assunto, ao qual está intimamente ligado.
Se perguntar por que João XXIII percebera a necessidade de reformar o Código em vigor, talvez a resposta se encontre no próprio Código promulgado em 1917. No entanto, existe outra resposta, que é a mais importante: a reforma do Código de Direito Canónico parecia claramente exigida e desejada pelo próprio Concilio, cuja maior atenção se tinha voltado para a Igreja.
Como é óbvio, ao divulgar-se a primeira notícia da revisão do Código, o Concílio ainda pertencia inteiramente ao futuro. Além disso, os actos de seu magistério, e principalmente sua doutrina sobre a Igreja, só se completariam nos anos de 1962 a 1965. A ninguém, porém, escapa ter sido acertadíssima a intuição de João XXIII, devendo sua decisão ser reconhecida como atendendo de antemão, com muita antecedência, ao bem da Igreja.
Por isso, o novo Código, que hoje se publica, exigia necessariamente o trabalho prévio do Concílio. Embora, pois, tenha sido anunciado simultaneamente com aquela assembleia Ecuménica, segue-se-lhe, contudo, no tempo. É que os trabalhos empreendidos em sua preparação, devendo basear-se no Concílio, só puderam ter início após a sua conclusão.
Volvendo, hoje, o pensamento para o início dessa caminhada, isto é, para o 25 de Janeiro de 1959, e, ao mesmo tempo, para o próprio João XXIII, o iniciador da revisão do Código, devemos confessar que este Código surgiu com propósito único de restaurar a vida cristã. Desse mesmo propósito, todo o trabalho do Concílio hauriu, em primeiro lugar, suas normas e orientação.
Se examinarmos a natureza dos trabalhos que precederam a promulgação do Código, bem como a própria maneira como foram executados, principalmente durante os pontificados de Paulo VI e João Paulo I, e depois até a presente dia, é de todo necessário ressaltar, com total clareza, terem sido realizados com espírito eminentemente colegial, não apenas presente à redacção material da obra, como também marcando profundamente o próprio conteúdo das leis elaboradas.
Essa nota de colegialidade tão característica do processo de origem deste Código, corresponde perfeitamente ao magistério e à índole do Concílio Vaticano II. Por isso, o Código, não somente por seu conteúdo, como já por sua origem, traz em si o espírito desse Concílio, em cujos documentos a Igreja, Sacramento universal da salvação (cf. Lumen Gentium, n. 9,48), se mostra como Povo de Deus, e apresenta sua constituição hierárquica, alicerçada no Colégio Episcopal em união com sua Cabeça.
Por esse motivo, os Bispos e os Episcopados foram convidados a colaborar na preparação do novo Código, a fim de que, através desse longo caminho, com método quanto possível colegial, amadurecessem pouco a pouco as formulações jurídicas a servirem depois para uso de toda a Igreja. Em todas as fases desse empreendimento, participaram dos trabalhos peritos, escolhidos de todas as partes do mundo, isto é, homens especializados na doutrina teológica, na história e sobretudo no direito canónico.
A todos e a cada um deles, queremos hoje manifestar nossos sentimentos de viva gratidão.
Em primeiro lugar se apresentam aos nossos olhos os Cardeais falecidos que presidiram à Comissão Preparatória: o Cardeal Pedro Ciriaci, que iniciou a obra, e o Cardeal Péricles Felici, que, por muitos anos, quase até ao seu término, orientou o andamento dos trabalhos. Em seguida, pensamos nos Secretários da mesma Comissão: o Revmo. Mons. Giacomo Violardo, depois Cardeal, e o Pe. Raimundo Bidagor, da Companhia de Jesus, os quais, no desempenho do cargo, prodigalizaram seus dons de ciência e sabedoria. Juntamente com eles, recordamos os Cardeais, Arcebispos, Bispos e todos os que foram membros dessa Comissão, bem como os Consultores de cada um dos grupos de estudo, dedicados durante esses anos a trabalho tão árduo, aos quais Deus já chamou para a recompensa eterna. Por todos eles, eleva-se até Deus nossa oração de sufrágio.
Apraz-nos igualmente recordar os que estão vivos, a começar pelo actual Pró-Presidente da Comissão, o Venerável Irmão Rosalio Castulo Lara, que por muitíssimo tempo trabalhou, de modo admirável, em tão importante encargo; depois dele, o dilecto filho Pe. Guilherme Oncím que, assídua e diligentemente, muito concorreu para o feliz êxito do trabalho, bem como todos os que na mesma Comissão, seja como membros Cardeais, seja como Oficiais, Consultores e Colaboradores nos grupos de estudos, ou em outros ofícios, prestaram inestimável contribuição para elaborar e aperfeiçoar obra de tamanha envergadura e de tanta complexidade.
Ao promulgar hoje o Código, estamos plenamente conscientes de que este ato emana de nossa autoridade Pontifícia, revestindo-se, portanto, de carácter primacial. No entanto, temos igualmente consciência de que este Código, por seu conteúdo, reflecte a solicitude colegial que pela Igreja nutrem todos os nossos Irmãos no Episcopado; mais ainda, por certa analogia com o próprio Concílio, este Código deve ser considerado como fruto da colaboração colegial, nascida das energias de pessoas e Institutos especializados da Igreja inteira, unidos por um só objectivo.
Outra questão que emerge é sobre a natureza do Código de Direito Canónico. Para responder devidamente a ela, cumpre recordar o antigo património de direito contido nos livros do Antigo e do Novo Testamento, de onde, como de fonte primária, emana toda a tradição jurídico-legislativa da Igreja.
Cristo Senhor, com efeito, de modo algum destruiu, mas, antes, deu pleno cumprimento (cf. Mt 5,17) à riquíssima herança da Lei e dos Profetas, formada paulatinamente pela história e experiência do Povo de Deus no Antigo Testamento. Dessa forma, ela se incorporou, de modo novo e mais elevado, a herança do Novo Testamento. Embora São Paulo, ao falar sobre o mistério pascal, ensine que a justificação não se realiza pelas obras da lei, mas por meio da fé (cf. Rom 3,28; cf. Gal 2,16), não exclui, contudo, a obrigatoriedade do Decálogo (cf. Rom 13, 8-10; cf. Gál 5, 13-25; 6,2), nem nega a importância da disciplina na Igreja de Deus (cf. 1 Cor 5-6). Os escritos do Novo Testamento permitem-nos, assim, perceber mais claramente essa importância da disciplina e entender melhor os laços que a ligam mais estreitamente à índole salvífica da própria Boa Nova do Evangelho.
Torna-se bem claro, pois, que o objectivo do Código não é, de forma alguma, substituir, na vida da Igreja ou dos fiéis, a fé, a graça, os carismas, nem muito menos a caridade. Pelo contrário, sua finalidade é, antes, criar na sociedade eclesial uma ordem que, dando a primazia ao amor, à graça e aos carismas, facilite ao mesmo tempo seu desenvolvimento orgânico na vida, seja da sociedade eclesial, seja de cada um de seus membros.
Como principal documento legislativo da Igreja, baseado na herança jurídico-legislativa da Revelação e da Tradição, o Código deve ser considerado instrumento indispensável para assegurar a devida ordem tanto na vida individual e social como na própria actividade da Igreja. Por isso, além dos elementos fundamentais da estrutura hierárquica e orgânica da Igreja, estabelecidos por seu Divino Fundador ou fundamentados na tradição apostólica ou em tradições antiquíssimas, e além das principais normas referentes ao exercício do tríplice menus confiado à Igreja, é necessário que o Código defina também certas regras e normas de acção.
O instrumento, que é o Código, combina perfeitamente com a natureza da Igreja, tal como é proposta, principalmente pelo magistério do Concílio Vaticano II, no seu conjunto e de modo especial na sua eclesiologia. Mais ainda, este novo Código pode, de certo modo, ser considerado como grande esforço de transferir, para a linguagem canonística, a própria eclesiologia conciliar. Se é impossível que a imagem de Igreja descrita pela doutrina conciliar se traduza perfeitamente na linguagem canonística, o Código, não obstante, deve sempre referir-se a essa imagem como modelo primordial, cujos traços, enquanto possível, ele deve em si, por sua natureza, exprimir.
Daí derivam algumas normas fundamentais, segundo as quais se rege todo o novo Código, nos limites, é claro, de sua matéria específica, bem como da própria linguagem adaptada a essa matéria. Até se pode afirmar que também daí é que promana a característica que faz considerar o Código como um complemento do magistério proposto pelo Concílio Vaticano II, particularmente no que tange às duas constituições, dogmática e pastoral.
A consequência é que a razão fundamental da novidade que, sem jamais afastar-se da tradição legislativa da Igreja, se encontra no Concílio Vaticano II, principalmente em sua eclesiologia, constitui também a razão da novidade no novo Código.
Entre os elementos que exprimem a verdadeira e autêntica imagem da Igreja, cumpre mencionar sobretudo os seguintes:
a doutrina que propõe a Igreja como Povo de Deus (cf. Const. Lumen Gentium 2), e a autoridade hierárquica como serviço (ibid. 3);
a doutrina que, além disso, apresenta a Igreja como comunhão e, por conseguinte, estabelece as relações que deve haver entre Igreja particular e Igreja universal, e entre a colegialidade e o primado;
a doutrina, segundo a qual todos os membros do Povo de Deus participam, a seu modo, do tríplice menus de Cristo: sacerdotal, profético e régio. A esta doutrina está unida também a que se refere aos deveres e direitos dos fiéis e expressamente dos leigos;
enfim, o esforço que a Igreja deve consagrar ao ecumenismo.
Portanto, se o Concílio Vaticano II hauriu elementos antigos e novos do tesouro da Tradição e se sua novidade se constitui por estes e outros elementos, é manifesto que o Código deve possuir a mesma característica de fidelidade na novidade e de novidade na fidelidade, conformando-se a ela em seu próprio campo e sua maneira especial de expressar-se.
O novo Código de Direito Canónico é publicado no momento em que os Bispos de toda a Igreja, não somente pedem sua publicação, como a solicitam com insistência e energia. De fato, o Código de Direito Canónico é totalmente necessário à Igreja. Constituída também como corpo social e visível, a Igreja precisa de normas: para que se torne visível sua estrutura hierárquica e orgânica; para que se organize devidamente o exercício das funções que lhe foram divinamente confiadas, principalmente as do poder sagrado e da administração dos sacramentos; para que se componham, segundo a justiça inspirada na caridade, as relações mútuas entre os fiéis, definindo-se e garantindo-se os direitos de cada um; e finalmente, para que as iniciativas comuns empreendidas em prol de uma vida cristã mais perfeita, sejam apoiadas, protegidas e promovidas pelas leis canónicas.
As leis canónicas, por sua natureza, exigem ser observadas. Por isso, foi empregada a máxima diligência para que na diuturna preparação do Código se conseguisse uma precisa formulação das normas e que estas se escudassem em sólido fundamento jurídico canónico e teológico.
Tudo considerado, é de augurar-se que a nova legislação canónica se torne instrumento eficaz, do qual se possa valer a Igreja, a fim de aperfeiçoar-se segundo o espírito do Concílio Vaticano II e tornar-se sempre mais apta para exercer, neste mundo, sua missão salvífica.
Apraz-nos transmitir a todos, com espírito confiante, essas considerações, ao promulgar o Corpus fundamental das leis eclesiásticas para a Igreja latina.
Queira Deus que a alegria e a paz, com justiça e obediência, façam valer este Código, e o que for determinado pela Cabeça seja obedecido no Corpo.
Confiando, pois, no auxílio da graça divina, sustentados pela autoridade dos Bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, com plena ciência e acolhendo os votos dos Bispos de todo o mundo, que com afecto colegial nos prestaram colaboração, com a suprema autoridade de que estamos revestido, por esta constituição a vigorar para o futuro, promulgamos o presente Código, compilado e revisto como se encontra. Determinamos que de ora em diante tenha força de lei para toda a Igreja latina, e o entregamos, para ser observado, à guarda e vigilância de todos a quem compete.
A fim de que todos possam mais seguramente informar-se sobre essas prescrições e conhecê-las suficientemente bem, antes de serem levadas a efeito, dispomos e determinamos que tenham força obrigatória a partir do primeiro dia do Advento de 1983, não obstante quaisquer disposições, constituições, privilégios, mesmo que dignos de especial ou singular menção, e costumes contrários.
Exortamos, pois, todos os dilectos filhos a que observem com sinceridade e boa vontade as normas propostas, na firme esperança de que refloresça a solícita disciplina da Igreja e de que, assim, sob a protecção da Beatíssima Virgem Maria, Mãe da Igreja, se promova mais e mais a salvação das almas.
- Dado em Roma, a 25 de Janeiro de 1983, na residência do Vaticano, no quinto ano do nosso Pontificado.
Papa João Paulo II
Spirituali Militum Curae
Constituição Apostólica
SPIRITUALI MILITUM CURAE
com a qual se dá uma nova regulamentação
à assistência espiritual aos militares
I. OCASIÃO
Desde sempre, com exímia solicitude e em modo proporcionado às diversas exigências, a Igreja procurou atender à cura espiritual dos Militares. Estes, com efeito, costituem um específico grupo social e, "pelas peculiares condições da sua vida", quer voluntariamente façam parte de modo estável das Forças Armadas, quer a elas sejam chamados por lei durante um tempo determinado, têm necessidade de uma concreta e específica forma de assistência pastoral. A esta exigência, no curso dos tempos, a sagrada Jerarquia e, em particular os Romanos Pontífices, pelo seu dever de serviço ou seja de "diaconia", têm providenciado em cada caso e do melhor modo, com uma jurisdição mais conforme às pessoas e às circunstâncias. Desse modo, foram pouco a pouco constituídas estruturas eclesiásticas nas várias Nações, à frente das quais era colocado um prelado munido das necessárias faculdades.
A Sagrada Constituição Consistorial estabeleceu nesta matéria normas prudentes com a instrução Sollemme Semper, de 23 de abril de 1951. Agora, porém, deve-se dizer que chegou o tempo de rever essas normas, para poderem ter maior força e eficácia. A isto leva, antes de mais nada, o Concílio Vaticano II, que abriu o caminho para realizar, de modo mais adequado, iniciativas pastorais especializadas, e tomou em atenta consideração a intervenção da Igreja no mundo contemporâneo, mesmo no que toca à edificação e à promoção da paz em todo o mundo. Nesta linha, aqueles que prestam o serviço militar devem considerar-se "como ministros da segurança e da liberdade dos povos", pois, "se cumprem com o seu dever retamente, concorrem também eles verdadeiramente para a estabilidade da paz".
Isto é aconselhado também pelas grandes mudanças que se deram não só no que diz respeito à profissão militar e às suas circunstâncias de vida, mas também no significado comum atribuído pela sociedade do nosso tempo à natureza e às tarefas das Forças Armadas na realidade da vida humana. A este passo, enfim, conduziu a promulgação do novo Código de Direito Canônico, que, em verdade, deixou inalteradas as normas relativas à assistência pastoral dos militares até aqui em vigor, as quais, contudo, são hoje oportunamente revistas, para que da sua equilibrada composição derivem frutos mais abundantes. Normas, porém, dêste gênero não podem ser idênticas para todos os Países, não sendo igual, nem absoluta nem relativamente, o número de católicos empenhados no serviço militar e sendo muito diversas as circunstâncias em cada um dos lugares.
Convém, portanto, que sejam aqui estabelecidas certas normas gerais, válidas para todos os Ordinariados militares - chamados até agora de Vicariatos Castrenses - que devem depois ser completadas, no quadro desta lei geral, com os estatutos instituídos pela Sé Apostólica para cada Ordinariado.
II. NORMAS
São portanto estabelecidas as seguintes normas:
I
§ 1. Os Ordinariados militares, que podem também chamar-se castrenses e que são juridicamente assimilados às dioceses, são circunscrições eclesiásticas especiais, regidas por estatutos próprios emanados pela Sé Apostólica, nos quais serão precisadas mais em pormenor as prescrições da presente Constituição, mantendo-se válidas, onde existem, as Convenções estipuladas entre a Santa Sé e os Estados.
§ 2. Onde as circunstâncias o aconselhem, ouvidas as Conferências Episcopais interessadas, seráo erectos pela Sé Apostólica os novos Ordinariados militares.
II
§ 1. À frente do Ordinariado militar é colocado, como próprio, um Ordinário normalmente constituído na dignidade episcopal, o qual goza de todos os direitos e está sujeito a todas as obrigações dos Bispos diocesanos, a não ser que conste diversamente pela natureza das coisas ou pelos estatutos particulares.
§ 2. O Sumo Pontífice nomeia livremente o Ordinário militar ou institui ou confirma o candidato legitimamente designado.
§ 3. Para que possa aplicar-se com todas as suas forças a esta específica missão pastoral, o Ordinário militar será normalmente liberto de outros ofícios que comportem cura de almas, a menos que exigências particulares de uma Nação aconselhem outra coisa.
§ 4. Entre o Ordinário militar e as outras Igrejas particulares deve existir um estreito vínculo de comunhão e uma coordenação de forças na ação pastoral.
III
O Ordinário militar faz parte de direito da Conferência Episcopal da Nação onde o Ordinário tem a sua própria sede.
IV
A jurisdição do Ordinário militar é: 1º. pessoal, tanto que pode exercer-se em relação às pessoas que fazem parte do Ordinariado, mesmo se por vezes se encontram fora dos confins nacionais; 2º. ordinária, tanto no foro interno como no foro externo; 3º. própria, mas cumulativa com a jurisdição do Bispo diocesano, visto que as pessoas pertencentes ao Ordinariado não deixam de ser fiéis daquela Igreja particular, de cujo povo fazem parte em razão do domicílio ou do rito.
V
Os ambientes e os lugares reservados aos militares estão sujeitos, primária e principalmente, à jurisdição do Ordinariado militar; de modo secundário, porém, estão também sujeitos à jurisdição do Bispo diocesano, isto é, quando faltem o Ordinário militar e os seus Capelães: em tal caso, quer o Bispo diocesano quer o pároco agem por direito próprio.
VI
§ 1. Além das pessoas contempladas nos seguintes parágrafos 3 e 4, o presbitério do Ordinariado castrense é formado pelos sacerdotes, tanto seculares quanto religiosos, que, dotados das necessárias qualidades para desempenhar proficuamente este especial ministério pastoral, e com o consentimento do próprio Ordinário, desempenham um serviço no Ordinariado militar.
§ 2. Os Bispos diocesanos e também os competentes superiores religiosos concedam ao Ordinariado castrense, em número suficiente, sacerdotes e diáconos idôneos para esta missão.
§ 3. O Ordinário militar pode, com a aprovação da Santa Sé, erigir um seminário e promover às ordens sagradas no Ordinariado os seus alunos, uma vez completada a específica formação espiritual e pastoral.
§ 4. Também outros clérigos podem ser incardinados no Ordinariado castrense, segundo as normas do direito.
§ 5. O conselho presbiteral tenha os seus estatutos, aprovados pelo Ordinário, tendo em conta as normas dadas pela Conferência episcopal.
VII
No âmbito que lhes é atribuído em relação às pessoas que lhe são confiadas, os sacerdotes que são nomeados capelães no Ordinariado gozam dos direitos e são obrigados a observar os deveres dos párocos, a não ser que, pela natureza das coisas ou pelos estatutos particulares, conste diversamente; cumulativamente contudo com o pároco do lugar, em conformidade com o Art. IV.
VIII
Quanto aos religiosos e aos membros das Sociedades de vida apostólica que prestem serviço no Ordinariado, preocupe-se com o Ordinário para que eles perseverem na fidelidade à vocação e ao carisma do próprio Instituto e mantenham estreitos laços com os seus Superiores.
IX
Devendo todos os fiéis cooperar na edificação do Corpo de Cristo, o Ordinário e o seu presbitério procedam de modo que os fiéis leigos do Ordinariado, tanto a nível pessoal como em forma associativa, desempenhem a sua função como fermento apostólico, e também missionário, entre os outros militares com quem vivem.
X
Além dos que estão determinados nos estatutos, em conformidade com o Art. I, pertencem ao Ordinariado militar e estão sob a sua jurisdição:
1º. Os fiéis que são militares, e também aqueles que estão ao serviço das Forças Armadas, contanto que sejam ligados pela norma das leis civis;
2º. Quantos compõem as suas famílias, isto é, os cônjuges e os filhos, mesmo maiores, se habitam na mesma casa, e também os parentes e as pessoas de serviço que, igualmente, habitam na mesma casa;
3º. Os que frequentam escolas militares ou estão internados ou prestam serviço nos hospitais militares, nas casas para anciãos ou noutros institutos similares;
4º. Todos os fiéis, homens e mulheres, membros ou não de um Instituto religioso, que desempenham de modo estável funções a eles confiadas pelo Ordinário militar ou com o seu consentimento.
XI
O Ordinário militar depende da Congregação para os Bispos ou da Congregação para a Evangelização dos Povos e, segundo os casos, trata as questões com os competentes Dicastérios da Cúria Romana.
XII
De cinco em cinco anos o Ordinário militar apresentará à Sé Apostólica a relação sobre a situação do Ordinariado, segundo a fórmula prescrita. De igual modo o Ordinário militar está sujeito às obrigações da Visita ad limina, segundo o direito.
XIII
Nos estatutos particulares, respeitadas as Convenções estipuladas entre a Santa Sé e os Estados, caso existam, serão precisados, entre outros, os seguintes pontos: 1º. em que lugar serão colocadas a Igreja do Ordinário castrense e a sua cúria; 2º. se deve haver um ou mais vigários-gerais e que outros oficiais de cúria devem ser nomeados; 3º. o que toca à condição eclesiástica do Ordinário castrense e dos outros sacerdotes ou diáconos adscritos ao Ordinariado militar, durante o cargo e ao deixarem o serviço, como também as prescrições e salvaguardas acerca da sua situação militar; 4º. como se há de providenciar em caso de sede vacante ou impedida; 5º. que dizer acerca do conselho pastoral quer do inteiro Ordinariado quer do local, tendo presentes as normas do Código de Direito Canônico; 6º. que livros se devem ter tanto no que respeita a administração dos Sacramentos como para o "status" das pessoas, segundo as leis universais e as prescrições da Conferência Episcopal.
XIV
Acerca das causas judiciais envolvendo fiéis do Ordinariado militar, competente em primeira instância é o Tribunal da diocese na qual tem a sua sede a cúria do Ordinariado militar, nos estatutos se designará de modo permanente o tribunal de apelação. Se porém o Ordinariado tem o seu tribunal, os recursos de apelação devem ser feitos ao tribunal que, com a aprovação da Sé Apostólica, o mesmo Ordinário Castrense tenha designado de modo estável.
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Quanto é prescrito nesta Nossa Constituição entrará em vigor na data de 21 de julho do corrente ano. As normas de direito particular porém conservar-se-ão em vigor na medida em que concordem com esta Constituição Apostólica. Os estatutos de cada Ordinariado castrense, redigidos em conformidade com o Art. I, deverão ser submetidos à revista da Santa Sé dentro de um ano que se deve contar a partir da mesma data.
Queremos que estas nossas disposições e normas sejam válidas e eficazes agora e no futuro, não obstando, se fosse necessário, as Constituições e as Ordenações Apostólicas emanadas pelos Nossos Predecessores, e qualquer outra prescrição mesmo digna de particular menção ou derrogação.
- Dado em Roma, junto de São Pedro, a 21 de abril do ano de 1986, oitavo do Nosso Pontificado.
JOÃO PAULO II, Papa.
Universi Dominici Gregis
Constituição Apostólica
UNIVERSI DOMINICI GREGIS
do Sumo Pontífice
João Paulo II
acerca da vacância da Sé Apostólica
e da eleição do Romano-Pontífice
João Paulo Bispo, servo dos servos de Deus, para perpétua memória.
Capítulo VII - Aceitação, proclamação e início do ministério do novo Pontífice
87. Uma vez efetuada canonicamente a eleição, o último dos Cardeais Diáconos chama para dentro do local da eleição o Secretário do Colégio dos Cardeais e o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias; em seguida, o Cardeal Decano, ou o primeiro dos Cardeais segundo a ordem e os anos de cardinalato, em nome de todo o Colégio dos eleitores, pede o consenso do eleito com as seguintes palavras: Aceitas a tua eleição canônica para Sumo Pontífice? E, uma vez recebido o consenso, pergunta-lhe: Como queres ser chamado? Então o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias, na função de Notário e tendo por testemunhas dois Cerimoniários, que serão chamados naquele momento, redige um documento com a aceitação do novo Pontífice e o nome por ele assumido.
88. Depois da aceitação, o eleito que tenha já recebido a Ordenação episcopal, é imediatamente o Bispo da Igreja de Roma, verdadeiro Papa e Cabeça do Colégio Episcopal; e adquire efetivamente o poder pleno e absoluto sobre a Igreja universal, e pode exercê-lo.
Se, pelo contrário, o eleito não possuir o caráter episcopal, seja imediatamente ordenado Bispo.
89. Cumpridas, entretanto, as outras formalidades previstas no Ordo rituum Conclavis, os Cardeais eleitores, segundo os modos estabelecidos, aproximam-se para render homenagem e prestar obediência ao neo-eleito Sumo Pontífice. Sucessivamente elevam-se a Deus ações de graças, após o que o primeiro dos Cardeais Diáconos anuncia ao povo, que está à espera, a eleição consumada e o nome do novo Pontífice, o qual, imediatamente a seguir, dá a Bênção Apostólica Urbi et Orbi do pórtico da Basílica do Vaticano.
Se o eleito ainda não possuir o caráter episcopal, só depois de ter sido solenemente ordenado Bispo é que lhe será prestada a homenagem e será feito o anúncio ao povo.
90. Se o eleito residir fora da Cidade do Vaticano, devem observar-se as normas contidas no mencionado Ordo rituum Conclavis.
A Ordenação episcopal do Sumo Pontífice eleito que não seja ainda Bispo, de que falam os nnº 88 e 89 da presente Constituição, será feita segundo o uso da Igreja do Decano do Colégio dos Cardeais ou, na sua ausência, do Vice-Decano ou, se também este se achasse impedido, do mais antigo dos Cardeais Bispos.
91. O Conclave termina logo que o novo Sumo Pontífice eleito tiver dado o consenso à sua eleição, a não ser que Ele determine diversamente. Desde esse momento, poderão encontrar-se com o novo Pontífice o Substituto da Secretaria de Estado, o Secretário para as Relações com os Estados, o Prefeito da Casa Pontifícia, e qualquer outra pessoa que tenha de tratar com o Pontífice eleito coisas de momento necessárias.
92. O Pontífice, depois da solene cerimônia de inauguração do pontificado e dentro do espaço conveniente de tempo, tomará posse da Arquibasílica Patriarcal Lateranense, segundo o rito prescrito.
Primeira Parte - A VACÂNCIA DA SÉ APOSTÓLICA
Capítulo I - Poderes do Colégio dos Cardeais durante a vacância da Sé Apostólica
1. Durante a vacância da Sé Apostólica, o Colégio dos Cardeais não tem poder ou jurisdição alguma no que se refere às questões da competência do Sumo Pontífice, enquanto estava vivo ou no exercício das funções do seu ofício; todas essas questões deverão ser exclusivamente reservadas ao futuro Pontífice. Declaro, por isso, inválido e nulo qualquer ato de poder ou de jurisdição, próprio do Romano Pontífice enquanto está vivo ou no exercício das funções do seu ofício, que o Colégio mesmo dos Cardeais julgasse exercer, a não ser dentro dos limites expressamente consentidos nesta Constituição.
2. Durante o tempo em que estiver vacante a Sé Apostólica, o governo da Igreja está confiado ao Colégio dos Cardeais, mas somente para o despacho dos assuntos ordinários ou inadiáveis (cf. nº 6), e para a preparação daquilo que é necessário para a eleição do novo Pontífice. Este encargo deverá ser desempenhado nos termos e limites previstos por esta Constituição: deverão, por isso, ficar absolutamente excluídos os assuntos, que - quer por lei, quer por costume - ou são apenas do poder do próprio Romano Pontífice, ou dizem respeito às normas para a eleição do novo Pontífice, segundo as disposições da presente Constituição.
3. Além disso, estabeleço que o Colégio Cardinalício não possa de modo algum dispor acerca dos direitos da Sé Apostólica e da Igreja Romana, e menos ainda deixar que se perca, direta ou indiretamente, qualquer coisa deles, mesmo que seja para compor dissídios ou perseguir ações perpetradas contra os mesmos direitos após a morte ou renúncia válida do Pontífice12. Seja preocupação de todos os Cardeais tutelar estes direitos.
4. Durante a vacância da Sé Apostólica, as leis emanadas pelos Sumos Pontífices não podem de modo algum ser corrigidas ou modificadas, nem se lhes pode acrescentar ou subtrair qualquer coisa, nem dispensar, mesmo que seja só de uma parte delas, sobretudo no que diz respeito ao ordenamento da eleição do Sumo Pontífice. Antes, se eventualmente acontecesse de ser feita ou tentada alguma coisa contra esta prescrição, com a minha suprema autoridade declaro-a nula e inválida.
5. Se porventura surgissem dúvidas acerca das prescrições contidas nesta Constituição ou sobre o modo de as pôr em prática, disponho formalmente que todo o poder de emitir um juízo a tal respeito compete ao Colégio dos Cardeais, ao qual, portanto, atribuo a faculdade de interpretar os seus pontos duvidosos ou controversos, estabelecendo que, quando for necessário deliberar sobre estas e outras questões semelhantes, exceto sobre o ato da eleição, é suficiente a maioria dos Cardeais congregados chegar a acordo sobre a mesma opinião.
6. De igual modo, quando existir um problema que, segundo a maior parte dos Cardeais reunidos, não pode ser diferido para outra altura, o Colégio dos Cardeais disponha segundo o parecer da maioria.
Capítulo II - As Congregações dos Cardeais preliminares à eleição do Sumo Pontífice
7. No período de Sé vacante, haverá duas espécies de Congregações dos Cardeais: uma geral, isto é, de todo o Colégio, até ao início da eleição, e a outra particular. Nas Congregações gerais, devem participar todos os Cardeais não legitimamente impedidos, logo que tenham sido informados da vacância da Sé Apostólica. Contudo, aos Cardeais que, nos termos do nº 33 desta Constituição, não gozam do direito de eleger o Pontífice, é concedida a faculdade de se absterem, se assim o preferirem, de participar nessas Congregações gerais.
A Congregação particular é constituída pelo Cardeal Camerlengo da Santa Igreja Romana e por três Cardeais, um de cada uma das ordens, extraídos à sorte dentre os Cardeais eleitores que já tenham chegado a Roma. O ofício destes três Cardeais, chamados Assistentes, cessa ao completar-se o terceiro dia, sucedendo-lhes no lugar, sempre por meio de sorteio, outros três pelo mesmo espaço de tempo, mesmo depois de iniciada a eleição.
Durante o período da eleição, as questões mais importantes, se for necessário, são tratadas pela assembléia dos Cardeais eleitores, ao passo que os assuntos ordinários continuam a ser tratados pela Congregação particular dos Cardeais. Nas Congregações gerais e particulares, durante o período de Sé vacante, os Cardeais trajem a habitual batina preta filetada e a faixa vermelha, com o solidéu, cruz peitoral e anel.
8. Nas Congregações particulares, devem ser tratadas apenas as questões de menor importância, que se apresentem diária ou ocasionalmente. Se surgirem questões mais graves e merecedoras de um exame mais profundo, devem ser sujeitas à Congregação geral. Além disso, o que tiver sido decidido, resolvido ou negado numa Congregação particular, não pode ser revogado, mudado, ou concedido por uma outra; o direito de o fazer pertence somente à Congregação geral, e com a maioria dos votos.
9. As Congregações gerais dos Cardeais realizar-se-ão no Palácio Apostólico do Vaticano ou, se o exigirem as circunstâncias, noutro lugar julgado mais oportuno pelos próprios Cardeais. A elas preside o Decano do Colégio ou, caso ele esteja ausente ou legitimamente impedido, o Vice-Decano. Na hipótese de um dos dois ou mesmo ambos já não gozarem, nos termos do nº 33 desta Constituição, do direito de eleger o Pontífice, à assembléia dos Cardeais eleitores presidirá o Cardeal eleitor mais antigo, segundo a ordem habitual de precedência.
10. O voto nas Congregações dos Cardeais, quando se trata de assuntos de maior importância, não deve ser dado de viva voz, mas de forma secreta.
11. As Congregações gerais que antecedem o início da eleição, por isso mesmo chamadas "preparatórias", devem realizar-se diariamente, a começar do dia que for estabelecido pelo Camerlengo da Santa Igreja Romana e pelo primeiro Cardeal de entre os eleitores, de cada uma das Ordens, mesmo nos dias em que forem celebradas as exéquias pelo Pontífice falecido. Tal deverá acontecer para, assim, tornar possível ao Cardeal Camerlengo ouvir o parecer do Colégio e transmitir-lhe as informações que retiver necessárias ou oportunas; e, simultaneamente, permitir a cada um dos Cardeais exprimir a sua opinião sobre os problemas que se apresentem, pedir explicações em casos de dúvida, e fazer propostas.
12. Nas primeiras Congregações gerais, proveja-se a que cada um dos Cardeais tenha à sua disposição uma cópia desta Constituição e, ao mesmo tempo, seja-lhes dada a possibilidade de propor eventualmente questões acerca do significado e da execução das normas estabelecidas na mesma. Além disso, convém que seja lida a parte da presente Constituição que se refere à vacância da Sé Apostólica. Entretanto, todos os Cardeais presentes deverão prestar juramento sobre a observância das prescrições que nela se contêm e sobre a guarda do segredo. Tal juramento, que deverá ser feito mesmo pelos Cardeais que, por terem chegado atrasados, só num segundo momento participam nestas Congregações, seja lido pelo Cardeal Decano ou, eventualmente, por outro presidente do Colégio, de acordo com a norma estabelecida no nº 9 desta Constituição, na presença dos outros Cardeais, segundo a fórmula seguinte:
"Nós, Cardeais da Santa Igreja Romana, da Ordem dos Bispos, dos Presbíteros e dos Diáconos, prometemos, obrigamo-nos e juramos, todos e cada um, observar exata e fielmente todas as normas contidas na Constituição Apostólica Universi Dominici Gregis do Sumo Pontífice João Paulo II, e guardar escrupulosamente o segredo sobre tudo aquilo que, de qualquer modo, se relacione com a eleição do Romano Pontífice, ou que, por sua natureza, durante a vacância da Sé Apostólica, postule o mesmo segredo."
Em seguida, cada um dos Cardeais dirá: E eu, N. Cardeal N., prometo, obrigo-me e juro. E, colocando a mão sobre o Evangelho, acrescentará: "Assim Deus me ajude e estes Santos Evangelhos, que toco com a minha mão."
13. Numa das Congregações imediatamente sucessivas, os Cardeais deverão, com base numa ordem do dia previamente estabelecida, tomar as decisões mais urgentes para iniciar as operações da eleição, ou seja:
a) estabeleçam o dia, a hora e o modo, em que o corpo do falecido Pontífice será trasladado para a Basílica do Vaticano, para ser exposto à homenagem dos fiéis;
b) predisponham tudo o que for necessário para as exéquias do falecido Pontífice, que deverão ser celebradas durante nove dias consecutivos, e fixem o início das mesmas, de tal modo que a sepultura tenha lugar, salvo razões especiais, entre o quarto e o sexto dia após a morte;
c) recomendem à Comissão, composta pelo Cardeal Camerlengo e pelos Cardeais que desempenhavam respectivamente os cargos de Secretário de Estado e de Presidente da Pontifícia Comissão para o Estado da Cidade do Vaticano, que prepare atempadamente quer os espaços da Domus Sanctae Marthae para o conveniente alojamento dos Cardeais eleitores, quer os aposentos necessários para quantos estão previstos no nº 46 da presente Constituição, e que, ao mesmo tempo, proveja a pôr em ordem tudo quanto seja necessário para a preparação da Capela Sistina, a fim de que as operações relativas à eleição possam desenrolar-se de maneira cômoda, ordenada e com a máxima reserva, segundo o que está previsto e estabelecido nesta Constituição;
d) confiem a dois eclesiásticos de íntegra doutrina, sabedoria e autoridade moral o encargo de proporem aos próprios Cardeais duas ponderadas meditações sobre os problemas da Igreja nesse momento e a escolha esclarecida do novo Pontífice; entretanto, mantendo o que está disposto no nº 52 desta Constituição, provejam a estabelecer o dia e a hora em que lhes deverá ser dirigida a primeira das referidas meditações;
e) aprovem - sob proposta da Administração da Sé Apostólica ou, na parte que lhe compete, do Governatorado do Estado da Cidade do Vaticano - as despesas havidas desde a morte do Pontífice até à eleição do sucessor;
f) leiam, se porventura existirem, os documentos deixados pelo falecido Pontífice para o Colégio dos Cardeais;
g) tomem providências no sentido de fazer anular o Anel do Pescador e o Selo de chumbo, com os quais são expedidas as relativas Cartas Apostólicas;
h) predisponham a atribuição, por sorteio, dos quartos aos Cardeais eleitores;
i) Estabeleçam dia e hora para o início das operações de voto.
Capítulo III - Acerca de alguns cargos durante o período da Sé Apostólica vacante
14. Por morte do Pontífice, como estabelece o artº 6 da Constituição Apostólica Pastor Bonus13, todos os Responsáveis dos Dicastérios da Cúria Romana, quer o Cardeal Secretário de Estado quer os Cardeais Prefeitos quer os Presidentes Arcebispos, bem como os Membros de tais Dicastérios cessam o exercício das suas funções. Excetuam-se o Camerlengo da Santa Igreja Romana e o Penitenciário-Mor, que continuam a despachar os assuntos ordinários, submetendo ao Colégio dos Cardeais o que deveria ser referido ao Sumo Pontífice.
Do mesmo modo, segundo a Constituição Apostólica Vicariae potestatis (nº 2-§ 1)14, o Cardeal Vigário Geral para a diocese de Roma não cessa as suas funções durante a vacância da Sé Apostólica, como também não as cessa, no que é da sua jurisdição, o Cardeal Arcipreste da Basílica do Vaticano e Vigário Geral para a Cidade do Vaticano.
15. Se porventura se acharem vagos os cargos de Camerlengo da Santa Igreja de Roma ou de Penitenciário-Mor, na altura da morte do Pontífice ou antes da eleição do Sucessor, o Colégio dos Cardeais deverá eleger, o quanto antes, o Cardeal ou, se for o caso, os Cardeais que hão-de ocupar o cargo até à eleição do novo Pontífice. Em cada um dos casos apontados, a eleição realiza-se por votação secreta de todos os Cardeais eleitores presentes, através de fichas, que serão distribuídas e recolhidas pelos Cerimoniários e, depois, abertas na presença do Camerlengo e dos três Cardeais Assistentes, se se tratar de eleger o Penitenciário-Mor; ou então, dos mesmos três Cardeais e do Secretário do Colégio dos Cardeais, se deve ser eleito o Camerlengo. Ficará eleito e passará ipso facto a usufruir de todas as faculdades inerentes ao cargo, aquele que recebeu a maioria dos sufrágios. No caso de empate de votos, será designado aquele que pertencer à ordem mais elevada, ou, dentro da mesma ordem, aquele que primeiro tiver sido criado Cardeal. Enquanto não for eleito o Camerlengo, as suas funções serão exercidas pelo Decano do Colégio ou, no caso da sua ausência ou legítimo impedimento, pelo Vice-Decano ou pelo Cardeal mais velho segundo a ordem habitual de precedência, em conformidade com o nº 9 desta Constituição, o qual poderá tomar, sem demora, as decisões que as circunstâncias aconselharem.
16. Se viesse a falecer, por sua vez, o Vigário Geral para a diocese de Roma, durante o período de Sé vacante, então o Vice-Gerente em exercício, para além da jurisdição ordinária vicária que lhe é própria, desempenhará também o múnus próprio do Cardeal Vigário15. Se porventura morrer também o Vice-Gerente, o Bispo há mais tempo nomeado para Auxiliar desempenhará as suas funções.
17. Logo que receber a notícia do falecimento do Sumo Pontífice, o Camerlengo da Santa Igreja Romana deve constatar oficialmente a morte do Pontífice, na presença do Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias, dos Prelados Clérigos da Câmara Apostólica e do Secretário e Chanceler da mesma, o qual lavrará o documento ou ata autêntica de morte. O Cardeal Camerlengo deve, ainda, aplicar os sigilos no escritório e no quarto do Pontífice, estabelecendo que o pessoal habitualmente residente no apartamento privado possa permanecer nele até se realizar a sepultura do Papa, quando será sigilado todo o apartamento pontifício; participar o seu falecimento ao Cardeal Vigário para a diocese de Roma, o qual, por seu turno, dará a notícia do mesmo ao Povo Romano, com uma notificação especial; e igualmente ao Cardeal Arcipreste da Basílica do Vaticano; tomar posse do Palácio Apostólico do Vaticano e - pessoalmente ou por meio de um seu delegado - dos Palácios de Latrão e de Castel Gandolfo, e exercer a custódia e o governo dos mesmos; estabelecer, depois de ouvidos os Cardeais primeiros das três ordens, tudo aquilo que diz respeito à sepultura do Pontífice, a não ser que este, enquanto vivia, tenha já manifestado a sua vontade a tal propósito; cuidar, em nome e com o consenso do Colégio dos Cardeais, de tudo aquilo que as circunstâncias aconselharem para a defesa dos direitos da Sé Apostólica e para a sua reta administração. Com efeito, é atribuição do Camerlengo da Santa Igreja Romana, durante o período de Sé vacante, cuidar e administrar os bens e os direitos temporais da Santa Sé, com o auxílio dos três Cardeais Assistentes, precedido - uma vez para as questões menos importantes, e todas as vezes para as mais graves - do voto do Colégio dos Cardeais.
18. O Cardeal Penitenciário-Mor e os seus Oficiais, durante a Sé vacante, poderão realizar aquilo que foi estabelecido pelo meu Predecessor Pio XI, na Constituição Apostólica Quae divinitus, de 25 de Março de 193516, e por mim próprio, na Constituição Apostólica Pastor Bonus17.
19. O Decano do Colégio dos Cardeais, por sua vez, logo que o Cardeal Camerlengo ou o Prefeito da Casa Pontifícia o haja informado da morte do Pontífice, tem a obrigação de comunicar a notícia a todos os Cardeais, convocando-os para as Congregações do Colégio. De igual modo, comunicará o falecimento do Pontífice ao Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé e aos Chefes supremos das respectivas nações.
20. Durante a vacância da Sé Apostólica, o Substituto da Secretaria de Estado bem como o Secretário para as Relações com os Estados, e os Secretários dos Dicastérios da Cúria Romana, mantêm a direção da respectiva Repartição e por ela respondem ao Colégio dos Cardeais.
21. Do mesmo modo, não cessa o cargo e relativos poderes dos Representantes Pontifícios.
22. Também o Esmoler de Sua Santidade continuará no exercício das obras de caridade, segundo os mesmos critérios usados quando estava vivo o Pontífice; e ficará dependente do Colégio dos Cardeais, até à eleição do novo Pontífice.
23. Durante a Sé vacante, todo o poder civil do Sumo Pontífice, concernente ao governo da Cidade do Vaticano, compete ao Colégio dos Cardeais, o qual, todavia, não pode emanar decretos, a não ser no caso de urgente necessidade e apenas pelo tempo que durar a vacância da Santa Sé. Tais decretos só serão válidos para o futuro, se o novo Pontífice os confirmar.
Capítulo IV - Faculdades dos Dicastérios da Cúria Romana durante a vacância da Sé Apostólica
24. Durante o período de Sé vacante, os Dicastérios da Cúria Romana, à excepção dos referidos no nº 26 desta Constituição, não têm faculdade alguma naquelas matérias que, Sede plena, não podem tratar ou realizar senão facto verbo cum Sanctissimo, ou ex Audientia Sanctissimi, ou, ainda, vigore specialium et extraordinariarum facultatum, que o Romano Pontífice costuma conceder aos Prefeitos, aos Presidentes ou aos Secretários desses Dicastérios.
25. Pelo contrário, não cessam, com a morte do Pontífice, as faculdades ordinárias próprias de cada um dos Dicastérios; estabeleço, todavia, que os Dicastérios façam uso delas apenas para conceder mercês de menor importância, ao passo que as questões mais graves ou controversas, se puderem ser diferidas, deverão ficar reservadas exclusivamente ao futuro Pontífice; se não admitem dilação (como, para além de outros, os casos in articulo mortis para as dispensas que o Sumo Pontífice costuma conceder), poderão ser confiadas pelo Colégio dos Cardeais ao Cardeal que fora Prefeito até à morte do Pontífice, ou ao Arcebispo até então Presidente, e aos outros Cardeais do mesmo Dicastério, ao exame de quem o Sumo Pontífice falecido, provavelmente, as haveria confiado. Em tais circunstâncias, eles poderão decidir per modum provisionis, até quando for eleito o Pontífice, aquilo que julgarem mais adequado e conveniente à salvaguarda e defesa dos direitos e das tradições eclesiásticas.
26. Durante a vacância da Sé Apostólica, o Supremo Tribunal da Signatura Apostólica e o Tribunal da Rota Romana continuam a tratar as causas, em conformidade com as suas leis próprias, observando todavia quanto está prescrito no artº 18 da Constituição Apostólica Pastor Bonus18.
Capítulo V - As exéquias do Romano Pontífice
27. Após a morte do Romano Pontífice, os Cardeais celebrarão as exéquias em sufrágio da sua alma, durante nove dias consecutivos, nos termos do Ordo exsequiarum Romani Pontificis, a cujas normas, assim como às do Ordo rituum Conclavis, eles se conformarão fielmente.
28. Se a sepultura se fizer na Basílica do Vaticano, o relativo documento autêntico será lavrado pelo Notário do Cabido da mesma Basílica ou pelo Cônego Arquivista. Sucessivamente, um delegado do Cardeal Camerlengo e um delegado do Prefeito da Casa Pontifícia elaborarão, separadamente, os documentos que façam fé acerca da sepultura realizada: o primeiro na presença dos membros da Câmara Apostólica, o outro em presença do Prefeito da Casa Pontifícia.
29. Se o Romano Pontífice falecer fora de Roma, compete ao Colégio dos Cardeais dispor tudo o que é necessário para uma digna e decorosa trasladação do cadáver para a Basílica de S. Pedro no Vaticano.
30. Não é lícito a ninguém fotografar nem captar imagens, seja pelo meio que for, do Sumo Pontífice, quer doente na cama, quer já defunto, nem gravar em fita magnética as suas palavras para depois reproduzi-las. Se alguém, depois da morte do Papa, quiser tirar-lhe fotografias a título de documentação, deverá pedir para isso a autorização ao Cardeal Camerlengo da Santa Igreja Romana, o qual, porém, não permitirá que sejam tiradas fotografias ao Sumo Pontífice senão revestido com as vestes pontificais.
31. Depois da sepultura do Sumo Pontífice e durante a eleição do novo Papa, nenhuma parte dos aposentos privados do Sumo Pontífice seja habitada.
32. Se o Sumo Pontífice falecido tiver feito testamento das suas coisas, deixando cartas e documentos pessoais, e tiver designado um próprio executor testamentário, compete a este estabelecer e executar, segundo o mandato recebido do testador, aquilo que concerne aos bens privados e aos escritos do defunto Pontífice. O referido executor dará satisfações daquilo que fizer unicamente ao novo Sumo Pontífice.
Segunda Parte - A ELEIÇÃO DO ROMANO PONTÍFICE
Capítulo I - Os eleitores do Romano Pontífice
33. O direito de eleger o Romano Pontífice compete unicamente aos Cardeais da Santa Igreja Romana, à excepção daqueles que tiverem completado, antes do dia da morte do Sumo Pontífice ou do dia em que a Sé Apostólica fique vacante, oitenta anos de idade. O número máximo de Cardeais eleitores não deve superar cento e vinte. É absolutamente excluído o direito de eleição ativa por parte de qualquer outra dignidade eclesiástica ou poder leigo de qualquer grau ou ordem.
34. Se porventura a Sé Apostólica ficar vacante durante a celebração de um Concílio Ecumênico ou de um Sínodo dos Bispos, quer se esteja a realizar em Roma quer noutra localidade do mundo, a eleição do novo Pontífice deve ser feita única e exclusivamente pelos Cardeais eleitores, que estão indicados no número anterior, e não pelo próprio Concílio ou Sínodo dos Bispos. Por isso, declaro nulos e inválidos os atos, que de qualquer modo tentassem temerariamente modificar as normas sobre a eleição ou o colégio dos eleitores. Mais ainda, confirmando a tal propósito aquilo que diz o cân. 340 bem como o cân. 347-§ 2 do Código de Direito Canônico, e o cân. 53 do Código dos Cânones das Igrejas Orientais, o próprio Concílio ou o Sínodo dos Bispos, seja qual for o ponto em que se encontre, deve considerar-se imediatamente suspenso ipso iure, logo que se tenha notícia da vacância da Sé Apostólica. Deve, por conseguinte, interromper, sem demora, qualquer reunião, congregação ou sessão, e deixar de compilar ou preparar qualquer decreto ou cânone, ou promulgar os que já foram confirmados, sob pena da sua nulidade; aliás, o Concílio ou o Sínodo não poderá continuar por razão alguma, ainda que gravíssima ou digna de especial menção, até que o novo Pontífice, canonicamente eleito, não ordene que ele seja retomado ou continuado.
35. Nenhum Cardeal eleitor poderá ser excluído da eleição, quer ativa quer passiva, por nenhum motivo ou pretexto, mantendo-se, porém, quanto está estabelecido no nº 40 desta Constituição.
36. Um Cardeal da Santa Igreja Romana, que tenha sido criado e publicado em Consistório, tem por isso mesmo o direito de eleger o Pontífice, nos termos do nº 33 da presente Constituição, mesmo que ainda não lhe tenha sido imposto o barrete, nem dado o anel nem ele tenha prestado o juramento. Pelo contrário, não gozam deste direito os Cardeais canonicamente depostos ou que tenham renunciado, com o consentimento do Romano Pontífice, à dignidade cardinalícia. Além disso, durante o período de Sé vacante, o Colégio dos Cardeais não os pode readmitir ou reabilitar.
37. Estabeleço, ainda, que, desde o momento em que a Sé Apostólica ficar legitimamente vacante, os Cardeais eleitores presentes devem esperar, durante quinze dias completos, pelos ausentes; deixo, ademais, ao Colégio dos Cardeais a faculdade de adiar, se houver motivos graves, o início da eleição por mais alguns dias. Transcorridos, porém, no máximo, vinte dias desde o início da Sé vacante, todos os Cardeais eleitores presentes são obrigados a proceder à eleição.
38. Todos os Cardeais eleitores, convocados pelo Cardeal Decano, ou por outro Cardeal em seu nome, para a eleição do novo Pontífice, estão obrigados, em virtude da santa obediência, a obtemperar ao anúncio de convocação e a dirigir-se para o lugar designado para tal fim, a não ser que se achem impedidos por doença ou outro impedimento grave, que, no entanto, deve ser reconhecido pelo Colégio dos Cardeais.
39. Se, entretanto, alguns Cardeais eleitores chegarem re integra, isto é, antes de se conseguir eleger o Pastor da Igreja, sejam admitidos aos trabalhos da eleição, no ponto em que estes se encontram.
40. Se, por acaso, algum Cardeal com direito a voto recusasse entrar na Cidade do Vaticano para se ocupar dos trabalhos da eleição, ou, depois quando esta já está iniciada, se recusasse a permanecer para cumprir o seu dever, sem uma clara razão de doença, reconhecida com juramento pelos médicos e comprovada pela maior parte dos eleitores, os outros procederão livremente às operações da eleição sem esperarem por ele nem o admitirem novamente. Se, pelo contrário, qualquer um dos Cardeais eleitores tiver de sair da Cidade do Vaticano por doença que lhe sobreveio, pode-se proceder à eleição, mesmo sem pedir o seu voto; mas se ele quiser entrar de novo na referida sede da eleição, depois da cura ou mesmo antes, deve ser readmitido.
Além disso, se algum Cardeal eleitor sair da Cidade do Vaticano por qualquer razão grave, reconhecida como tal pela maioria dos eleitores, pode retornar para continuar a participar na eleição.
Capíulo II - O lugar da eleição e as pessoas lá admitidas em razão do seu ofício
41. O Conclave para a eleição do Sumo Pontífice realizar-se-á dentro do território da Cidade do Vaticano, em setores e edifícios determinados, vedados aos estranhos, de tal maneira que seja garantido um conveniente alojamento e permanência dos Cardeais eleitores e de quantos, por legítimo título, estão chamados a colaborar no regular exercício da referida eleição.
42. No momento fixado para o início das operações da eleição do Sumo Pontífice, todos os Cardeais eleitores deverão ter recebido e ocupado condigno alojamento na designada Domus Sanctae Marthae, recentemente construída na Cidade do Vaticano.
Se razões de saúde, comprovadas previamente por uma específica Congregação Cardinalícia, exigirem que algum Cardeal eleitor tenha junto dele, inclusive durante o período da eleição, um enfermeiro, dever-se-á prover a que seja oportunamente assegurado alojamento também a este.
43. Desde o momento em que foi disposto o início das operações da eleição até ao anúncio público da eleição concretizada do Sumo Pontífice, ou, de qualquer modo, até quando assim tiver determinado o novo Pontífice, os espaços da Domus Sanctae Marthae, bem como, e de modo especial, a Capela Sistina e os lugares destinados às celebrações litúrgicas, deverão, sob a autoridade do Cardeal Camerlengo e com a colaboração externa do Substituto da Secretaria de Estado, ser fechados às pessoas não autorizadas, conforme se estabelece nos números seguintes.
Todo o território da Cidade do Vaticano e ainda a atividade ordinária das Repartições, que têm a sede dentro do mesmo, deverão ser regulados, durante o referido período, de modo que fiquem assegurados a reserva e o livre exercício de todas as operações conexas com a eleição do Sumo Pontífice. De forma particular, dever-se-á tomar providências para que os Cardeais eleitores não sejam abordados por ninguém quando forem transportados da Domus Sanctae Marthae ao Palácio Apostólico do Vaticano.
44. Os Cardeais eleitores, desde o início das operações da eleição até quando esta for conseguida e publicamente anunciada, abstenham-se de trocar correspondência epistolar, telefônica ou por outros meios de comunicação com pessoas estranhas ao âmbito de realização da mesma eleição, senão por comprovada e urgente necessidade, devidamente reconhecida pela Congregação particular, como se diz no nº 7. Compete a esta mesma Congregação reconhecer aos Cardeais, Penitenciário-Mor, Vigário Geral para a diocese de Roma e Arcipreste da Basílica do Vaticano, a necessidade e a urgência de comunicar com as respectivas Repartições.
45. A todos aqueles que não estão indicados no número seguinte, mas a justo título presentes na Cidade do Vaticano, como previsto no nº 43 desta Constituição, e que, casualmente, devessem encontrar algum dos Cardeais eleitores em tempo de eleição, é-lhes absolutamente proibido manter colóquio, sob qualquer forma, com qualquer meio e por qualquer motivo, com os mesmos Padres Cardeais.
46. Para acudirem às exigências pessoais e de serviço, conexas com a realização da eleição, deverão estar disponíveis, e, consequentemente, alojados em lugares convenientes dentro dos confins apontados no nº 43 da presente Constituição, o Secretário do Colégio Cardinalício, que desempenha as funções de Secretário da assembléia eleitoral; o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias, com dois Cerimoniários e dois religiosos adscritos à Sacristia Pontifícia; um eclesiástico escolhido pelo Cardeal Decano ou pelo Cardeal que o substitua, para lhe servir de assistente.
Deverá, também, haver à disposição alguns religiosos de diversas línguas para as confissões, bem como dois médicos para eventuais emergências.
Ter-se-á, ainda, de prover a tempo para que um número conveniente de pessoas, adscritas aos serviços da alimentação e de limpeza, esteja disponível para o efeito.
Todas as pessoas aqui indicadas deverão receber aprovação prévia do Cardeal Camerlengo e dos três Assistentes.
47. Todas as pessoas elencadas no nº 46 da presente Constituição, que, por qualquer motivo e a qualquer momento, chegassem a ter conhecimento, por quem quer que fosse, daquilo que, direta ou indiretamente, concerne aos atos próprios da eleição e, de modo especial, de algo atinente aos próprios escrutínios havidos para a eleição, estão obrigadas a guardar estrito segredo com qualquer pessoa estranha ao Colégio dos Cardeais eleitores; com tal objetivo, antes do início das operações para a eleição, deverão prestar juramento segundo as modalidades e a fórmula indicadas no número seguinte.
48. As pessoas apontadas no nº 46 da presente Constituição, devidamente advertidas sobre o significado e a extensão do juramento a prestar, antes do início das operações para a eleição, perante o Cardeal Camerlengo ou outro Cardeal por ele delegado, na presença de dois Cerimoniários, deverão no tempo devido pronunciar e subscrever o juramento segundo a fórmula seguinte:
Eu, N. N., prometo e juro observar o segredo absoluto e com toda a pessoa que não fizer parte do Colégio dos Cardeais eleitores, e isto perpetuamente, a não ser que receba especial faculdade dada expressamente pelo novo Pontífice eleito ou pelos seus sucessores, acerca de tudo aquilo que concerne direta ou indiretamente às votações e aos escrutínios para a eleição do Sumo Pontífice.
De igual modo, prometo e juro de me abster de fazer uso de qualquer instrumento de gravação, de audição, ou de visão daquilo que, durante o período da eleição, se realizar dentro dos confins da Cidade do Vaticano, e particularmente de quanto, direta ou indiretamente, tiver a ver, de qualquer modo, com as operações ligadas à própria eleição.
Declaro proferir este juramento, consciente de que uma infração ao mesmo comportará para a minha pessoa aquelas sanções espirituais e canônicas que o futuro Sumo Pontífice (cf. cân. 1399 do Código de Direito Canônico), julgar dever adotar.
Assim Deus me ajude e estes Santos Evangelhos, que toco com a minha mão.
Capítulo III - O início dos atos da eleição
49. Celebradas, segundo os ritos prescritos, as exéquias do Pontífice falecido, e preparado tudo aquilo que é necessário para o regular exercício da eleição, no dia estabelecido - a saber, no décimo quinto dia da morte do Pontífice, ou, se for o caso previsto no nº 37 da presente Constituição, não depois do vigésimo dia -, os Cardeais eleitores reunir-se-ão na Basílica de S. Pedro no Vaticano, ou noutro sítio segundo a oportunidade e as necessidades do tempo e do lugar, para tomarem parte numa solene celebração litúrgica com a Missa votiva pro eligendo Papa19. Isto dever-se-á realizar, se possível, em hora conveniente da parte da manhã, de modo que, na parte da tarde, se possa realizar o que está prescrito nos números seguintes da presente Constituição.
50. Saindo da Capela Paulina no Palácio Apostólico, onde se congregarão em hora conveniente da parte da tarde, os Cardeais eleitores com vestes corais dirigir-se-ão, em procissão solene e invocando, com o cântico do Veni Creator, a assistência do Espírito Santo, para a Capela Sistina do Palácio Apostólico, lugar e sede da realização da eleição.
51. Conservando os elementos essenciais do Conclave, mas modificando algumas modalidades secundárias, que a alteração das circunstâncias tornou irrelevantes para o objetivo a que anteriormente serviam, com a presente Constituição estabeleço e disponho que todas as operações da eleição do Sumo Pontífice, de acordo com quanto se prescreve nos números seguintes, se realizem exclusivamente na Capela designada Sistina do Palácio Apostólico Vaticano, que permanece, por isso, lugar absolutamente reservado até se conseguir a eleição, de tal modo que seja garantido o segredo total daquilo que lá for feito ou dito de qualquer modo respeitante, direta ou indiretamente, à eleição do Sumo Pontífice.
Por isso, será preocupação do Colégio Cardinalício, actuando sob a autoridade e responsabilidade do Camerlengo coadjuvado pela Congregação particular, como se diz no nº 7 da presente Constituição, que, no interior da referida Capela e dos lugares adjacentes, tudo seja previamente disposto, também com a ajuda do Substituto da Secretaria de Estado pelo que diz respeito ao exterior, de forma que sejam tuteladas a regular eleição e a reserva da mesma.
De modo especial, hão-de ser feitos cuidadosos e severos controles, inclusivamente com o auxílio de pessoas de plena confiança e capacidade técnica comprovada, para que nos referidos lugares não estejam subdolosamente instalados meios audiovisuais de reprodução e transmissão para o exterior.
52. Os Cardeais eleitores, chegados à Capela Sistina, em conformidade com o disposto no nº 50, e ainda na presença daqueles que fizeram parte da solene procissão, proferirão o juramento, pronunciando a fórmula indicada no número seguinte.
Lerá a fórmula, em voz alta, o Cardeal Decano ou o primeiro dos Cardeais segundo a ordem e os anos de cardinalato, como estabelecido no nº 9 desta Constituição; no fim, cada um dos Cardeais eleitores, tocando o Santo Evangelho, lerá e pronunciará a fórmula, tal como indicada no número seguinte.
Depois de ter prestado juramento o último dos Cardeais eleitores, será intimado pelo Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias o extra omnes, e todas as pessoas estranhas ao Conclave deverão deixar a Capela Sistina.
Nesta, ficarão apenas o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias e o eclesiástico já escolhido para fazer aos Cardeais eleitores a segunda das duas meditações - referida atrás na alínea d) do nº 13 - acerca da gravíssima tarefa que sobre eles incumbe e, ainda, sobre a necessidade de agir com a devida atenção pelo bem da Igreja universal, solum Deum prae oculis habentes.
53. Em conformidade com o disposto no número anterior, o Cardeal Decano ou o primeiro dos Cardeais segundo a ordem e os anos de cardinalato, proferirá a seguinte fórmula de juramento:
Nós, todos e cada um dos Cardeais eleitores, presentes nesta eleição do Sumo Pontífice, prometemos, obrigamo-nos e juramos observar fiel e escrupulosamente todas as prescrições contidas na Constituição Apostólica do Sumo Pontífice João Paulo II, Universi Dominici Gregis, emanada a 22 de Fevereiro de 1996. De igual modo, prometemos, obrigamo-nos e juramos que quem quer de nós, que, por divina disposição, for eleito Romano Pontífice, comprometer-se-á a desempenhar fielmente o munus Petrinum de Pastor da Igreja universal e não cessará de afirmar e defender estrenuamente os direitos espirituais e temporais, assim como a liberdade da Santa Sé. Sobretudo prometemos e juramos observar, com a máxima fidelidade e com todos, tanto clérigos como leigos, o segredo acerca de tudo aquilo que, de algum modo, disser respeito à eleição do Romano Pontífice e sobre aquilo que suceder no lugar da eleição, concernente direta ou indiretamente ao escrutínio; não violar, de modo nenhum, este segredo, quer durante quer depois da eleição do novo Pontífice, a não ser que para tal seja concedida explícita autorização do próprio Pontífice; não dar nunca apoio ou favor a qualquer interferência, oposição ou outra forma qualquer de intervenção, pelas quais autoridades seculares de qualquer ordem e grau, ou qualquer gênero de pessoas, em grupo ou individualmente, quisessem imiscuir-se na eleição do Romano Pontífice.
Em seguida, cada um dos Cardeais eleitores, por ordem de precedência, prestará juramento com a fórmula seguinte:
E eu, N. Cardeal N., prometo, obrigo-me e juro, e, colocando a mão sobre o Evangelho, acrescentará: Assim Deus me ajude e estes Santos Evangelhos, que toco com a minha mão.
54. Proferida a meditação, o eclesiástico que a fez, sai da Capela Sistina juntamente com o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias. Então, rezadas as orações indicadas no respectivo Ordo, o Cardeal Decano (ou quem o substitui), antes de mais, pergunta ao Colégio dos eleitores se já se pode proceder ao início das operações da eleição, ou se é preciso ainda clarificar dúvidas acerca das normas e modalidades estabelecidas nesta Constituição, sem que, todavia, seja consentido, mesmo que haja a unanimidade dos eleitores, e isto sob pena de nulidade da mesma deliberação, modificar ou substituir alguma delas que implique substancialmente com os atos da própria eleição.
Em seguida, se, a juízo da maioria dos eleitores, nada impedir que se proceda às operações da eleição, passar-se-á imediatamente a elas, sempre segundo as modalidades indicadas nesta Constituição.
Capítulo IV - Observância do segredo sobre tudo aquilo que diz respeito à eleição
55. O Cardeal Camerlengo e os três Cardeais Assistentes pro tempore são obrigados a vigiar diligentemente para que de modo nenhum seja violado o segredo daquilo que sucede na Capela Sistina, onde se realizam as operações de votação, e dos lugares contíguos, tanto antes de tais operações como durante e depois das mesmas.
De modo particular, recorrendo inclusive à perícia de dois técnicos de confiança, procurarão tutelar tal segredo, inteirando-se de que nenhum meio de captação ou transmissão audiovisual seja introduzido por quem quer que for nos lugares indicados, especialmente na mencionada Capela, onde se desenrolam os atos da eleição.
Se for realizada e descoberta qualquer infração contra esta norma, saibam os seus autores que serão sujeitos a penas graves, a decidir pelo futuro Pontífice.
56. Durante todo o tempo que durarem as operações da eleição, os Cardeais eleitores são obrigados a abster-se de correspondência epistolar e de conversas mesmo telefônicas ou via rádio com pessoas não devidamente admitidas nos edifícios a eles reservados.
Somente razões gravíssimas e urgentes, comprovadas pela Congregação particular dos Cardeais, como referido no nº 7, poderão consentir tais conversas.
Por isso, os Cardeais eleitores deverão procurar, antes de ser dado início aos atos da eleição, organizar tudo o que diga respeito às suas exigências de serviço ou pessoais não diferíveis, de modo que, depois, não seja necessário recorrer a semelhantes contatos.
57. Os Cardeais eleitores deverão, igualmente, abster-se de receber ou enviar mensagens de qualquer gênero para fora da Cidade do Vaticano, sendo naturalmente proibido a qualquer pessoa aí legitimamente admitida fazer de portador das mesmas. De modo específico, é proibido aos Cardeais eleitores, durante todo o tempo que durarem as operações da eleição, receber imprensa diária e periódica, de qualquer natureza, assim como ouvir transmissões radiofônicas ou ver transmissões televisivas.
58. Aqueles que, de qualquer modo, como previsto no nº 46 da presente Constituição, prestam serviço em incumbências inerentes à eleição, e que, portanto, direta ou indiretamente, poderiam violar o segredo - por palavras ou escritos, por sinais, ou outra coisa qualquer - deverão absolutamente evitá-lo, porque, caso contrário, incorreriam na pena de excomunhão latae sententiae, reservada à Sé Apostólica.
59. De forma particular, é proibido aos Cardeais eleitores revelar, a qualquer outra pessoa, notícias que, direta ou indiretamente, digam respeito às votações, assim como aquilo que foi tratado ou decidido acerca da eleição do Pontífice nas reuniões dos Cardeais, quer antes quer durante o tempo da eleição. Esta obrigação do segredo estende-se também aos Cardeais não eleitores que participem nas Congregações gerais, como estipulado no nº 7 da presente Constituição.
60. Ordeno, ainda, que os Cardeais eleitores, graviter onerata ipsorum conscientia, conservem segredo destas coisas, mesmo depois de ter sido efetuada a eleição do novo Pontífice, recordando-se de que não é lícito violá-lo, seja de que modo for, se não lhes tiver sido concedida a tal propósito uma especial e explícita faculdade pelo próprio Pontífice.
61. Por fim, para que os Cardeais eleitores possam defender-se da indiscrição de outrem ou de eventuais insídias, que pudessem ser armadas à sua independência de ponderação e à sua liberdade de decisão, proíbo absolutamente que, sob qualquer pretexto, se introduzam nos lugares onde se realizam as operações da eleição ou, no caso de lá se encontrarem já, sejam utilizados instrumentos técnicos de qualquer gênero, que sirvam para gravar, reproduzir e transmitir vozes, imagens ou escritos.
Capítulo V - A realização da eleição
62. Abolidos os modos de eleição designados per acclamationem seu inspirationem e per compromissum, doravante a forma de eleição do Romano Pontífice será unicamente per scrutinium.
Estabeleço, portanto, que, para a válida eleição do Romano Pontífice, se requerem os dois terços dos sufrágios, calculados com base na totalidade dos eleitores presentes.
Caso o número dos Cardeais presentes não possa ser dividido em três partes iguais, requer-se, para a validade da eleição do Sumo Pontífice, um sufrágio a mais.
63. À eleição, proceder-se-á imediatamente depois de terem sido cumpridos os atos indicados no nº 54 da presente Constituição.
Se porventura isso se verificar já na tarde do primeiro dia, neste haverá um só escrutínio; nos dias sucessivos, se a eleição não se fizer no primeiro escrutínio, deverá haver duas votações, tanto da parte da manhã como da tarde, dando sempre início às operações de voto na hora já anteriormente estabelecida nas Congregações preparatórias ou durante o período da eleição, mas segundo as modalidades estabelecidas nos nnº 64 e seguintes da presente Constituição.
64. O escrutínio desenrola-se em três fases, a primeira das quais - designada pré-escrutínio - compreende:
a) a preparação e a distribuição das fichas pelos Cerimoniários, que entregarão ao menos duas ou três a cada um dos Cardeais eleitores;
b) a extração à sorte entre todos os Cardeais eleitores de três Escrutinadores, três encarregados de ir recolher os votos dos doentes - aqui designados por razões de brevidade Infirmarii -, e três Revisores; esse sorteio é feito em público pelo último Cardeal Diácono, o qual extrairá sucessivamente os nove nomes daqueles que deverão desempenhar tais funções;
c) se, na extração dos Escrutinadores, Infirmarii e Revisores, saírem nomes de Cardeais eleitores que, por doença ou outro motivo, se achem impedidos de desempenhar tais funções, sejam extraídos para o seu lugar os nomes de outros não impedidos. Os primeiros três extraídos farão o papel de Escrutinadores, os três seguintes de Infirmarii, e os outros três de Revisores.
65. Para esta fase do escrutínio, importa ter presente as seguintes disposições:
a) a ficha de voto deve ter a forma retangular, e ter escrito na parte superior, se possível em caracteres impressos, as palavras: Eligo in Summum Pontificem, ao passo que, na metade inferior, se deverá deixar em branco o espaço para escrever o nome do eleito; assim, a ficha é feita de molde a que possa ser dobrada em duas partes;
b) o preenchimento das fichas deve ser feito secretamente por cada um dos Cardeais eleitores, o qual escreverá claramente, mas com grafia o mais possível não identificável, o nome de quem elege, evitando escrever outros nomes, porque se o fizesse o voto seria nulo, e dobrando depois a ficha ao meio por duas vezes consecutivas;
c) na Capela Sistina, durante as votações, deverão permanecer só os Cardeais eleitores, e, por isso, imediatamente após a distribuição das fichas e antes de os eleitores começarem a escrever, o Secretário do Colégio dos Cardeais, o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias e os Cerimoniários devem sair do local; depois da sua saída, o último Cardeal Diácono feche a porta, voltando a abri-la e a fechá- la todas as vezes que isso for necessário, como por exemplo quando os Infirmarii saem para recolher os votos dos doentes e reentram na Capela.
66. A segunda fase, chamada escrutínio no sentido verdadeiro e próprio do termo, compreende:
a) a deposição das fichas de voto na respectiva urna;
b) a mistura e a contagem das mesmas;
c) o apuramento dos votos.
Cada Cardeal eleitor, pela ordem de precedência, depois de ter escrito e dobrado a ficha, mantendo-a levantada de modo que seja visível, leva-a ao altar, junto do qual estão os Escrutinadores e em cima do qual é colocado um recipiente coberto com um prato para recolher as fichas. Chegado aí, o Cardeal eleitor pronuncia, em voz alta, a seguinte forma de juramento: Invoco como testemunha Cristo Senhor, o qual me há de julgar, que o meu voto é dado àquele que, segundo Deus, julgo deve ser eleito. Em seguida, depõe a ficha de voto no prato e com este introdu-la no recipiente. Tendo realizado isto, faz uma inclinação ao altar, e volta para o seu lugar.
Se algum dos Cardeais eleitores presentes na Capela não puder dirigir-se ao altar, por motivo de doença, o último dos Escrutinadores irá junto dele, e ele, depois de proferir o juramento referido, entrega a ficha de voto dobrada ao Escrutinador o qual a leva, bem visível, ao altar e, sem pronunciar o juramento, depõe-na sobre o prato e com este introdu-la no recipiente.
67. Se houver Cardeais eleitores doentes nos seus aposentos, referidos nos nnº 41 e seguintes desta Constituição, os três Infirmarii dirigem-se a esses aposentos com uma caixa que tenha na parte superior um orifício, através do qual possa ser introduzida uma ficha dobrada. Os Escrutinadores, antes de entregar essa caixa aos Infirmarii, abri-la-ão publicamente, de modo que os outros eleitores possam constatar que está vazia, depois fechem-na e coloquem a chave sobre o altar. Em seguida, os Infirmarii, com a caixa fechada e um conveniente número de fichas num pequeno prato, vão, devidamente acompanhados, à Domus Sanctae Marthae, junto de cada doente, o qual, recebida a ficha, vota secretamente, dobra-a e, emitido antes o referido juramento, introdu-la na caixa através do orifício. Se porventura algum doente não puder escrever, um dos três Infirmarii ou outro Cardeal eleitor, escolhido pelo doente, depois de ter prestado juramento nas mãos dos próprios Infirmarii de observar o segredo, realiza as mencionadas operações. Depois disto, os Infirmarii levam outra vez para a Capela a caixa, que será aberta pelos Escrutinadores depois de terem depositado o seu voto os Cardeais presentes, contando as fichas que lá se encontram, e, uma vez comprovado que o seu número corresponde ao dos doentes, ponham-nas uma a uma sobre o prato e com este introduzam-nas, todas juntas, no recipiente. Para não demorar demasiado as operações da votação, os Infirmarii poderão preencher e depor as próprias fichas no recipiente imediatamente a seguir ao primeiro dos Cardeais, e ir, depois, recolher o voto dos doentes, da maneira acima indicada, enquanto os demais eleitores depõem a sua ficha de voto.
68. Depois de todos os Cardeais terem deposto a própria ficha de voto na urna, o primeiro Escrutinador agita-a diversas vezes para misturar as fichas e, imediatamente a seguir, o último Escrutinador procede à contagem das mesmas, tirando da urna, de forma visível, uma de cada vez e colocando-a num outro recipiente vazio, já preparado para tal fim. Se porventura o número das fichas não corresponder ao número dos eleitores, é preciso queimá-las todas e proceder imediatamente a uma segunda votação; se, pelo contrário, corresponder ao número dos eleitores, segue-se o apuramento dos votos, conforme se indica a seguir.
69. Os Escrutinadores sentam-se a uma mesa, colocada diante do altar: o primeiro deles toma uma ficha, abre-a, observa o nome do eleito e passa-a ao segundo Escrutinador que, certificando-se por sua vez do nome do eleito, passa-a ao terceiro, o qual a lê, em voz alta e inteligível, de modo que todos os eleitores presentes possam anotar o voto, numa folha apropriada para isso. O próprio Escrutinador, que faz de pregoeiro, anota o nome lido na ficha. Se porventura, no apuramento dos votos, os Escrutinadores encontrarem duas fichas dobradas de maneira tal que pareçam preenchidas por um único eleitor, e se em ambas figura o mesmo nome, elas contam por um único voto; se, pelo contrário, nelas figuram dois nomes diferentes, nenhum dos dois votos será válido; em nenhum dos casos, porém, será anulada a votação.
Terminado o apuramento das fichas, os Escrutinadores procedem à soma dos votos obtidos pelos diversos nomes, e anotam-nos numa folha separada. O último dos Escrutinadores, à medida que vai lendo as fichas de voto, fura-as com uma agulha, no ponto onde se encontra a palavra Eligo, e insere-as num fio, a fim de que possam ser mais seguramente conservadas. No fim da leitura dos nomes, as pontas do fio são atadas com um nó, e as fichas assim unidas são colocadas num recipiente, ou a um lado da mesa.
70. Segue-se depois a terceira e última fase, chamada também pós-escrutínio, que compreende:
a) a contagem dos votos;
b) o seu controle;
c) a queima das fichas.
Os Escrutinadores fazem a soma de todos os votos, que cada um obteve, e se ninguém tiver conseguido dois terços dos votos nessa votação, o Papa não foi eleito; se, pelo contrário, resultar que alguém obteve os dois terços, verificou-se a eleição do Romano Pontífice canonicamente válida.
Em ambos os casos, isto é, quer se tenha dado a eleição quer não, os Revisores devem proceder ao controle tanto das fichas, como das anotações feitas pelos Escrutinadores, para se ter a certeza de que estes se desempenharam exata e fielmente do seu encargo.
Imediatamente após a revisão, antes de os Cardeais eleitores abandonarem a Capela Sistina, todas as fichas serão queimadas pelos Escrutinadores, com a ajuda do Secretário do Colégio e dos Cerimoniários, entretanto chamados pelo último Cardeal Diácono. Se, porém, se devesse proceder imediatamente a uma segunda votação, as fichas da primeira seriam queimadas somente no final, juntamente com as da segunda votação.
71. Ordeno a todos e a cada um dos Cardeais eleitores que, a fim de se guardar com maior segurança o segredo, entreguem os escritos de qualquer espécie que tenham consigo, relacionados com o resultado de cada escrutínio, ao Cardeal Camerlengo ou a um dos três Cardeais Assistentes, para serem queimados juntamente com as fichas dos votos.
Estabeleço, além disso, que, no final da eleição, o Cardeal Camerlengo da Santa Igreja Romana elabore um relatório, que há de ser aprovado também pelos três Cardeais Assistentes, no qual declare o resultado das votações em cada uma das sessões. Este relatório será entregue ao Papa e ficará depois guardado no respectivo arquivo, encerrado num envelope sigiloso que não poderá ser aberto por ninguém, a não ser que o Sumo Pontífice lho tenha explicitamente permitido.
72. Confirmando as disposições dos meus Predecessores, S. Pio X20, Pio XII21, e Paulo VI22, prescrevo que - à excepção da tarde da entrada em Conclave -, tanto na parte da manhã como na parte da tarde, imediatamente depois de uma votação na qual não se tenha obtido a eleição, os Cardeais eleitores procedam logo a uma segunda, em que exprimam de novo o seu voto. Neste segundo escrutínio, devem ser observadas todas as formalidades do primeiro, com a diferença de que os eleitores não são obrigados a prestar um novo juramento, nem a eleger novos Escrutinadores, Infirmarii e Revisores, valendo para esse fim, também no segundo escrutínio, aquilo que foi feito no primeiro, sem repetição alguma.
73. Tudo isto que acaba de ser estabelecido acerca da realização das votações, deve ser diligentemente observado pelos Cardeais eleitores em todos os escrutínios, que devem realizar-se todos os dias, na parte da manhã e na parte da tarde, após a celebração das sagradas funções ou preces que se acham indicadas no mencionado Ordo rituum Conclavis.
74. Caso os Cardeais eleitores tivessem dificuldade em pôr-se de acordo quanto à pessoa a eleger, então, realizados sem êxito durante três dias os escrutínios, segundo a forma descrita nos nnº 62 e seguintes, aqueles serão suspensos durante um dia, no máximo, para uma pausa de oração, de livre colóquio entre os votantes e de uma breve exortação espiritual, feita pelo primeiro dos Cardeais da ordem dos Diáconos. Em seguida, recomeçam as votações segundo a mesma forma, e se, após sete escrutínios, ainda não se verificar a eleição, faz-se outra pausa de oração, de colóquio e de exortação, feita pelo primeiro dos Cardeais da ordem dos Presbíteros. Procede-se, depois, a uma outra eventual série de sete escrutínios, seguida - se ainda não se tiver obtido o resultado esperado -, de uma nova pausa de oração, de colóquio e de exortação, feita pelo primeiro dos Cardeais da ordem dos Bispos. Em seguida, recomeçam as votações segundo a mesma forma, as quais, se não for conseguida a eleição, serão sete.
75. Se as votações não tiverem êxito, mesmo depois de ter procedido como estipulado no número precedente, os Cardeais eleitores serão convidados pelo Camerlengo a darem a sua opinião sobre o modo de proceder, e proceder-se-á segundo aquilo que a maioria absoluta deles tiver estabelecido.
Todavia não se poderá renunciar à exigência de haver uma válida eleição, ou com a maioria absoluta dos sufrágios ou votando somente os dois nomes que, no escrutínio imediatamente anterior, obtiveram a maior parte dos votos, exigindo-se, também nesta segunda hipótese, somente a maioria absoluta.
76. No caso de a eleição ser feita de uma forma diversa daquela prescrita na presente Constituição ou sem terem sido observadas as condições aqui estabelecidas, tal eleição é por isso mesmo nula e inválida, sem necessidade de qualquer declaração, e, portanto, não confere direito algum à pessoa eleita.
77. Estabeleço que as disposições referentes a tudo aquilo que precede a eleição do Romano Pontífice e à realização da mesma, devem ser integralmente observadas, mesmo no caso que a vacância da Sé Apostólica houvesse de verificar-se por renúncia do Sumo Pontífice, nos termos do cân. 332-§ 2 do Código de Direito Canônico, e do cân. 44-§ 2 do Código dos Cânones das Igrejas Orientais.
Capítulo VI - Aquilo que deve ser observado ou evitado na eleição do Sumo Pontífice
78. Se na eleição do Romano Pontífice fosse perpetrado - que Deus nos livre disso - o crime da simonia, delibero e declaro que todos aqueles que se tornarem culpáveis do mesmo incorrem em excomunhão latae sententiae, mas que todavia fica abolida a nulidade ou não validade dessa mesma provisão simoníaca, para que, por tal motivo - como já estabelecido pelos meus Predecessores -, não venha a ser impugnada a validade da eleição do Romano Pontífice23.
79. Confirmando igualmente as prescrições dos Predecessores, proíbo a qualquer pessoa, mesmo se revestida da dignidade cardinalícia, fazer negociações, enquanto o Pontífice estiver vivo e sem o ter consultado, acerca da eleição do seu Sucessor, ou prometer votos, ou, ainda, tomar decisões a este respeito em conciliábulos privados.
80. Do mesmo modo, quero confirmar aquilo que foi sancionado pelos meus Predecessores, com o objetivo de excluir toda e qualquer intervenção externa na eleição do Sumo Pontífice. Por isso novamente, em virtude da santa obediência e sob pena de excomunhão latae sententiae, proíbo a todos e a cada um dos Cardeais eleitores, presentes e futuros, bem como ao Secretário do Colégio dos Cardeais e a todos os demais participantes na preparação e na concretização daquilo que é necessário para a eleição, receber, seja sob que pretexto for, de qualquer autoridade civil o encargo de propor o veto ou a chamada exclusiva, mesmo sob a forma de simples desejo, ou então de o manifestar quer no seio do Colégio dos eleitores reunido todo junto, quer aos eleitores individualmente, por escrito ou de viva voz, direta e imediatamente ou indiretamente e por meio de outros, seja antes do início da eleição seja durante o desenrolar da mesma. Tal proibição, é meu intento fazê-la extensiva a todas as possíveis interferências, oposições, desideratos, com que as autoridades seculares de qualquer nível e grau, ou qualquer gênero de pessoas, em grupo ou individualmente, quisessem imiscuir-se na eleição do Pontífice.
81. Os Cardeais eleitores abstenham-se, além disso, de todas as formas de pactuação, convenção, promessa, ou outros compromissos de qualquer gênero, que os possam obrigar a dar ou a negar o voto a um ou a alguns. Se isto, realmente, se tivesse verificado, mesmo que fosse sob juramento, decreto que tal compromisso é nulo e inválido e que ninguém está obrigado a observá-lo; e, desde já, comino a pena de excomunhão latae sententiae para os transgressores desta proibição. Todavia, não é meu intento proibir que, durante o período de Sé vacante, possa haver troca de idéias acerca da eleição.
82. De igual modo, proíbo aos Cardeais fazerem, antes da eleição, capitulações, ou seja, tomarem compromissos de comum acordo, obrigando-se a pô-los em prática no caso de um deles vir a ser elevado ao Pontificado. Também estas promessas, se porventura fossem realmente feitas, mesmo sob juramento, declaro-as nulas e inválidas.
83. Com a mesma insistência dos meus Predecessores, exorto vivamente os Cardeais eleitores a que, ao elegerem o Pontífice, não se deixem guiar por simpatia ou aversão, nem influenciar por favores ou pessoal amizade de alguém, nem impelir pela ingerência de autoridades ou de grupos de pressão, nem pela sugestão dos meios de comunicação social, por violência, por medo ou pela busca de popularidade. Mas, tendo em vista unicamente a glória de Deus e o bem da Igreja, depois de terem implorado o auxílio divino, dêem o seu voto àquele, mesmo de fora do Colégio Cardinalício, que retiverem idôneo, mais do que os outros, para reger, com fruto e utilidade, a Igreja universal.
84. Durante a Sé vacante, e sobretudo no período em que se realiza a eleição do Sucessor de Pedro, a Igreja está unida, de modo muito particular, com os Pastores sagrados e especialmente com os Cardeais eleitores do Sumo Pontífice, e implora de Deus o novo Papa como dom da sua bondade e providência. Com efeito, seguindo o exemplo da primeira comunidade cristã, de que se fala nos Atos dos Apóstolos (cf. 1,14), a Igreja universal, unida espiritualmente com Maria, Mãe de Jesus, deve perseverar unanimemente na oração; deste modo, a eleição do novo Pontífice não será um fato disjunto do Povo de Deus e reservado apenas ao Colégio dos eleitores, mas, em certo sentido, uma ação de toda a Igreja. Estabeleço, portanto, que, em todas as cidades e demais lugares, ao menos naqueles de maior importância, após ter sido recebida a notícia da vacância da Sé Apostólica e, de modo particular, da morte do Pontífice, depois da celebração de solenes exéquias por ele, se elevem humildes e instantes preces ao Senhor (cf. Mt 21,22; Mc 11,24), para que ilumine o espírito dos eleitores e os torne de tal maneira concordes na sua missão, que se obtenha uma rápida, unânime e frutuosa eleição, como o exigem a salvação das almas e o bem de todo o Povo de Deus.
85. Isto mesmo recomendo, de modo muito sentido e cordial, aos venerandos Padres Cardeais que, por razão de idade, já não gozam do direito de participar na eleição do Sumo Pontífice. Pelo especialíssimo vínculo com a Sé Apostólica que a púrpura cardinalícia comporta, dirijam o Povo de Deus, reunido particularmente nas Basílicas Patriarcais da cidade de Roma mas também nos lugares de culto das outras Igrejas particulares, para que, pela oração assídua e intensa, sobretudo enquanto se desenrola a eleição, se obtenha de Deus Onipotente a assistência e a luz do Espírito Santo necessária aos seus Irmãos eleitores, participando assim, eficaz e realmente, na árdua missão de prover a Igreja universal do seu Pastor.
86. Peço, depois, àquele que for eleito que não se subtraia ao cargo, a que é chamado, pelo temor do seu peso, mas que se submeta, humildemente, ao desígnio da vontade divina. Com efeito, Deus, quando lhe impõe o ônus, também o ampara com a sua mão, para que não se sinta impotente para o carregar; quando Lhe confere o pesado encargo, dá-lhe também o auxílio para o cumprir, e quando lhe confere a dignidade, concede-lhe também a força, para que não sucumba sob o peso do cargo.
Capítulo VII - Aceitação, proclamação e início do ministério do novo Pontífice
87. Uma vez efetuada canonicamente a eleição, o último dos Cardeais Diáconos chama para dentro do local da eleição o Secretário do Colégio dos Cardeais e o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias; em seguida, o Cardeal Decano, ou o primeiro dos Cardeais segundo a ordem e os anos de cardinalato, em nome de todo o Colégio dos eleitores, pede o consenso do eleito com as seguintes palavras: Aceitas a tua eleição canônica para Sumo Pontífice? E, uma vez recebido o consenso, pergunta-lhe: Como queres ser chamado? Então o Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias, na função de Notário e tendo por testemunhas dois Cerimoniários, que serão chamados naquele momento, redige um documento com a aceitação do novo Pontífice e o nome por ele assumido.
88. Depois da aceitação, o eleito que tenha já recebido a Ordenação episcopal, é imediatamente o Bispo da Igreja de Roma, verdadeiro Papa e Cabeça do Colégio Episcopal; e adquire efetivamente o poder pleno e absoluto sobre a Igreja universal, e pode exercê-lo.
Se, pelo contrário, o eleito não possuir o caráter episcopal, seja imediatamente ordenado Bispo.
89. Cumpridas, entretanto, as outras formalidades previstas no Ordo rituum Conclavis, os Cardeais eleitores, segundo os modos estabelecidos, aproximam-se para render homenagem e prestar obediência ao neo-eleito Sumo Pontífice. Sucessivamente elevam-se a Deus ações de graças, após o que o primeiro dos Cardeais Diáconos anuncia ao povo, que está à espera, a eleição consumada e o nome do novo Pontífice, o qual, imediatamente a seguir, dá a Bênção Apostólica Urbi et Orbi do pórtico da Basílica do Vaticano.
Se o eleito ainda não possuir o caráter episcopal, só depois de ter sido solenemente ordenado Bispo é que lhe será prestada a homenagem e será feito o anúncio ao povo.
90. Se o eleito residir fora da Cidade do Vaticano, devem observar-se as normas contidas no mencionado Ordo rituum Conclavis.
A Ordenação episcopal do Sumo Pontífice eleito que não seja ainda Bispo, de que falam os nnº 88 e 89 da presente Constituição, será feita segundo o uso da Igreja do Decano do Colégio dos Cardeais ou, na sua ausência, do Vice-Decano ou, se também este se achasse impedido, do mais antigo dos Cardeais Bispos.
91. O Conclave termina logo que o novo Sumo Pontífice eleito tiver dado o consenso à sua eleição, a não ser que Ele determine diversamente. Desde esse momento, poderão encontrar-se com o novo Pontífice o Substituto da Secretaria de Estado, o Secretário para as Relações com os Estados, o Prefeito da Casa Pontifícia, e qualquer outra pessoa que tenha de tratar com o Pontífice eleito coisas de momento necessárias.
92. O Pontífice, depois da solene cerimônia de inauguração do pontificado e dentro do espaço conveniente de tempo, tomará posse da Arquibasílica Patriarcal Lateranense, segundo o rito prescrito.
PROMULGAÇÃO
Portanto, depois de matura reflexão, e movido pelo exemplo dos meus Predecessores, estabeleço e prescrevo estas normas, deliberando que ninguém ouse impugnar a presente Constituição e quanto nela está contido, por qualquer causa que seja. A mesma há de ser por todos inviolavelmente observada, não obstante qualquer disposição em contrário, mesmo se digna de especialíssima menção. Ela produza e obtenha seus plenos e íntegros efeitos, e sirva de guia a todos aqueles a quem diz respeito.
Declaro igualmente ab-rogadas, como ficou atrás estabelecido, todas as Constituições e Ordenamentos emanados a este propósito pelos Sumos Pontífices, e, ao mesmo tempo, declaro completamente destituído de valor tudo aquilo que, por quem quer que seja, com qualquer autoridade, consciente ou inconscientemente, for tentado em sentido contrário a esta Constituição.
Dado em Roma, junto de S. Pedro, no dia 22 de Fevereiro, Festa da Cátedra de S. Pedro Apóstolo, do ano 1996, décimo oitavo de Pontificado.
REFERÊNCIAS
1S. Ireneu, Adv. haeres. III,3,2: SCh 211, 33.
2Cf. Const. ap. Vacante Sede Apostolica (25 de Dezembro de 1904): Pii X Pontificis Maximi Acta, III (1908), 239-288.
3Cf. Motu próprio Cum proxime (1 de Março de 1922): AAS 14 (1922), 145-146; Const. ap. Quae divinitus (25 de Março de 1935): AAS 27 (1935), 97-113.
4Cf. Const. ap. Vacantis Apostolicae Sedis (8 de Dezembro de 1945): AAS 38 (1946), 65-99.
5Cf. Motu próprio Summi Pontificis electio (5 de Setembro de 1962): AAS 54 (1962), 632-640.
6Cf. Const. ap. Regimini Ecclesiae universae (15 de Agosto de 1967): AAS 59 (1967), 885-928; Motu próprio Ingravescentem aetatem (21 de Novembro de 1970): AAS 62 (1970), 810-813; Const. ap. Romano Pontifici eligendo (1 de Outubro de 1975): AAS 67 (1975), 609-645.
7Cf. AAS 80 (1988), 841-912.
8Cf. CONC. ECUM. VAT. I, Const. dogm. sobre a Igreja de Cristo Pastor aeternus, III; CONC. ECUM. VAT. II, Const. dogm. sobre a Igreja Lumen gentium, 18.
9Código de Direito Canónico, cân. 332-§ 1; cf. Código dos Cânones das Igrejas Orientais, cân. 44-§ 1.
10Cf. Motu próprio Ingravescentem aetatem (21 de Novembro de 1970), II, 2: AAS 62 (1970), 811; Const. ap. Romano Pontifici eligendo (1 de Outubro de 1975), 33: AAS 67 (1975), 622.
11Código de Direito Canónico, cân. 1752.
12Cf. Código de Direito Canónico, cân. 332-§ 2; Código dos Cânones das Igrejas Orientais, cân. 44-§ 2.
13Cf. AAS 80 (1988), 860.
14Cf. AAS 69 (1977), 9-10.
15Cf. Const. ap. Vicariae potestatis (6 de Janeiro de 1977), 2-§ 4: AAS 69 (1977), 10.
16Cf. nº 12: AAS 27 (1935), 112-113.
17Cf. artº 171: AAS 80 (1988), 905.
18Cf. AAS 80 (1988), 864.
19Missale Romanum, IV, 795.
20Cf. Const. ap. Vacante Sede Apostolica (25 de Dezembro de 1904), 76: Pii X Pontificis Maximi Acta, III (1908), 280-281.
21Cf. Const. ap. Vacantis Apostolicae Sedis (8 de Dezembro de 1945), 88: AAS 38 (1946), 93.
22Cf. Const. ap. Romano Pontifici eligendo (1 de Outubro de 1975), 74: AAS 67 (1975), 639.
23Cf. S. PIO X, Const. ap. Vacante Sede Apostolica (25 de Dezembro de 1904), 79: Pii X Pontificis Maximi Acta, III (1908), 282; PIO XII, Const. ap. Vacantis Apostolicae Sedis (8 de Dezembro de 1945), 92: AAS 38 (1946) 94; PAULO VI, Const. ap. Romano Pontifici eligendo (1 de Outubro de 1975), 79: AAS 67 (1975), 641.
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