quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Introdução à Teologia
Jerry Adriano Villanova Chacon[1]
Introdução à Teologia
Neste primeiro momento convém fazermos um diálogo inicial no sentido de nos conhecermos, pois antes de começarmos a estudar a teologia temos que viver a teologia. Isso implica na necessidade de um autoconhecimento do indivíduo que se propõe ao ato de teologar, ou seja, indagar sobre Deus e sua ação no mundo. Quem sou eu? Essa é uma pergunta antiga, mas sempre atual ao ser humano, afinal de contas, um cão não pergunta quem ele é e, menos ainda, cria perspectivas do poderia ser.
Há muito medo por parte de algumas pessoas que começam o estudo da teologia, medo de perder a fé. Esse medo, no entanto, não passa de um ponto a ser eliminado em nossa sala de aula, porque para se fazer teologia é de fundamental importância a fé, nesse sentido o fazer teologia, acima de tudo, brota da própria experiência eclesial.
O estudo da teologia mexe muito com o homem, pois ela é uma ciência que serve de resposta ao anseio humano de buscar uma possibilidade transcendente a sua imanência, ou seja, na teologia o homem encontra também uma resposta existencial. Por conta dessa dimensão existencial podemos dizer que a teologia conhece várias correntes, fases e circunstâncias.
1.1 - A Questão do Medo da Teologia
É comum assistirmos a filmes que em dado momento cria-se uma situação de medo. Como, por exemplo, a cena de um filme na qual onde menos se espera surge um monstro, um assassino. Teço uma pergunta por que a pessoa fica com medo?
Sim, o medo surge de uma ação inesperada como o buraco do metro em São Paulo. Pode-se, portanto, afirmar que temos muito medo daquilo que nos é estranho, novo, diferente, enfim, construímos uma barreira psicológica.
O medo é uma grande barreira que nos impede de “ver-julgar-agir” dentro da realidade dada, o medo nos paralisa. Aprofundando um pouco mais essa reflexão pode afirmar-se que o medo cria um pré-conceito. O que é um conceito?
A palavra conceito encontra muitas definições, mas de modo geral ele é uma representação mental de algo material. Há, por exemplo, milhões de carros no mundo, mas quando falo carro cada um pensa um modelo-conceito específico de carro na cabeça, sendo ele o que representa os demais. Ninguém pensa os milhões de carros.
Agora o pré-conceito é algo formulado antes de um conhecimento aprofundado da coisa, por isso se diz que são preconceituosos aqueles que discriminam os negros, indígenas, nordestinos, por fazer um conceito de que nenhum presta.
A teologia sofre também esse pré-conceito. Faço uma pergunta: quando vocês falaram que estudariam teologia o que tiveram como resposta? Alguns podem ter falado vocês vão perder a fé! Isso é um grande pré-conceito.
Como afirma o teólogo Hermilo Pretto no livro: “A teologia tem algo a dizer a respeito do ser humano?”.
A existência humana não é um jogo de cartas marcadas. Pelo que diz respeito especificamente à ciência humana que denominamos teologia, há que se acrescentar uma ulterior dificuldade: o apriori da fé.[2]
Essa afirmação do teólogo nos coloca alguns dados fundamentais para podermos adentrar nos estudos teológicos o primeiro é de que nossa existência não é um jogo de cartas marcadas, ou seja, não está dada e acabada de maneira padrão, estável e pronta, mas é algo que vai se construindo se articulando, nossa existência é um grande processo, mas esse processo deve ser sentido por nós devemos ser agentes de nossa existência.
O segundo dado é de que a teologia é uma ciência humana. O que é isso? As ciências humanas são aquelas que estão sempre inferindo sobre o mundo, sobre o homem e suas realidades. Parece contraditório a teologia, que quer dizer estudo, tratado sobre Deus, ser uma ciência humana, mas isso se aprofundará mais à frente.
E, por fim, o terceiro ponto e para nós mais central é a questão da fé como base de toda teologia. A palavra apriori quer dizer algo anterior a algo. Por exemplo, quando digo que o giz que tenho nas mãos irá cair se eu o soltar é por conta de uma experiência ou de um conhecimento que eu já tive ou possuo.
Para se fazer, portanto, uma boa teologia é necessário ter, sim, apriori o dado de fé. Com essa reflexão espero ter demonstrado que a visão de que a teologia acaba com a fé é uma inverdade, um erro e, acima de tudo, uma forma de se fechar ao conhecimento.
1.2 - A Teologia e o Homem
A dimensão religiosa em nosso contexto histórico é renegada, não que não se fale em Deus, mas acontece que não se vive mais em Deus para isso há um fator que aumenta essa renegação a ciência que se coloca como a dona da verdade. Digo das ciências exatas, mas não as desmereço.
Pensa-se que somente as ciências exatas podem trazer ao homem um verdadeiro conhecimento e que ela suplantará a dimensão religiosa. Em relação a essa postura das ciências exatas há uma resposta das ciências humanas como a filosofia, teologia, biologia e outras que afirmam que o homem não é um mero ser calculável ou um “jogo de cartas marcadas”. Mas, então, o que é o homem?
Essa é uma pergunta muito antiga talvez uma das primeiras sobre o homem. Sócrates já dizia: “conheça-te a ti mesmo”
Muitas pessoas escreveram sobre isso e fazendo uma síntese disso aponto duas afirmações em relação ao homem. A primeira é a de que o homem é pura razão essa afirmação é defendida por uma ciência mais exata mecânica e nos mostra como máquinas. A segunda é a de que o homem não é apenas razão, mas também emoção essa é defendida pelas ciências humanas.
O homem é o ser que é capaz de ler a mensagem do mundo. Jamais é um analfabeto. É sempre aquele que, na multiplicidade de linguagens, pode ler e interpretar. Viver é ler e interpretar.[3]
Não podemos negar no homem a dimensão que vai além da matéria, isto é, a tão chamada dimensão transcendental.
1.3 - Um Estudo que Requer Reverência
O estudo da teologia requer reverência religiosa (Ex 3,5) tirar as sandálias é o mesmo que se colocar em estado de humildade, essa é uma dimensão que o teólogo deve sempre carregar a humildade do próprio Deus que até lavou os pés dos seus discípulos.
O filósofo e teólogo Kierkegaard[4] elaborou uma parábola que como personagem central se encontrava um palhaço, de fato um palhaço não transmite muita seriedade, mas certa feita ocorreu um grande incêndio e apenas o palhaço havia percebido e correu para avisar os demais que o ignoraram talvez por não crerem ser possível surgir uma verdade de alguém que trabalha o lado sensível das pessoas, então o palhaço era visto de forma hilária, enfim infelizmente a teologia hoje é vista como esse palhaço por muitas correntes de pensamentos, mas como o palhaço anuncia uma grande verdade que é desmerecida.
Por isso para se estudar teologia é necessário o ato reverente do estudante e nesse processo se apresentam dois momentos fundamentais para fazer a teologia o primeiro é o escutar, envolver-se com a angústia dos irmãos e, num segundo momento, colocar-se em reflexão solitária, em oração, enfim, em silêncio.
Fazer teologia é diferente de estudar teologia, pois “a teologia é uma coisa viva, uma coisa que escapa, que se movimenta que avança” [5]. Não podemos cair na tentação das perguntas com respostas pré-fabricadas que simplesmente nos são jogadas. Deve haver verdadeiramente um indagar de perguntas teológicas. “A teologia prefere dispor-se, de maneira, gratuita, a ser companheira de viagem da solidão do homem moderno” [6].
2 - Conceito e Natureza da Teologia
Ao dar início em um curso de teologia é muito importante deixar clara a dimensão do fazer teologia, por isso a aula de teologia deve levar o aluno a fazer teologia. Conforme Libanio e Afonso Murad, em seu Livro: “Introdução à Teologia”, o “aprendiz de teólogo” deve lograr como objetivo o viver a teologia, celebrá-la, rezá-la.
Nesse sentido o curso de teologia conhece algumas funções fundamentais e que serão abordadas neste momento.
Antes, porém, de adentrar nas funções é de caráter justo e ético esclarecer que as idéias centrais desta apostila são extraídas do livro: “Introdução à Teologia”, mas para uma maior possibilidade de divulgar as idéias do livro realizo este resumo.
Aprender teologia, fazer teologia, aprender a fazer teologia e viver celebrativa e orantemente a teologia. São essas as dimensões que devem perpassar qualquer atividade teológica, pois não nos colocam em uma atitude mecânica e sem vida.
O estudo da teologia deve estimular o aluno a entrar na própria teologia de modo que aprendendo a fazer teologia possa fazer alguns “vôos teológicos próprios e principalmente vivendo-a a partir de sua fé e oração”.
2.1 - Aprender teologia – essa função possui um caráter mais passivo no sentido de se ter na teologia uma dinâmica mais voltada para a apropriação de conteúdos teológicos já elaborados e que são comunicados em aula e leituras.
Olhando por esse viés pode-se dizer que é uma teologia feita e acabada onde o aluno exerce uma dinâmica mais memorativa dos conteúdos. Essa função era muito valorizada no período da Escolástica antes do Concílio Vaticano II. “A teologia ilumina a inteligência, povoa-a de conhecimentos importantes para a vida do aluno”. [7]
2.2 - Fazer teologia – o fazer teologia se dá de duas maneiras ou de duas formas no plano do “discurso religioso” e no plano do “espontâneo”. À medida que o cristão da razão, a sua fé a si mesmo e aos outros ele, mesmo não percebendo, está envolvido com a tarefa de fazer teologia, pois no momento que há uma reflexão, sobre a fé surge essa teologia espontânea, popular.
A teologia técnica ou discurso religioso, por outro lado, se dá a partir do momento em que a pessoa que possui uma fé, ou seja, quem crê elabora sua reflexão com base nas regras do discurso teológico.
Essas duas formas de se fazer teologia são logradas na própria vida, pois a vida oferece muitos lugares para isso. “Faz-se teologia ao produzir-se novas formas de expressão de revelação da tradição viva da Igreja”.[8]
O que gera toda essa dinâmica? É o confronto com a realidade, com a existência nesse embate surgem questões dentro de um processo interminável. Temos a pastoral como melhor forma de fazer teologia.
2.3 - Aprender a fazer teologia – essa etapa é muito comum em diversas atividades de nossa vida, por exemplo, para se fazer uma lasanha antes é necessário aprende a fazer, ou seja, deve haver uma observação de como se faz uma lasanha por meio de uma pessoa que a saiba fazer – cozinheiro (a).
Na teologia se dá o mesmo nossos autores citam o exemplo de entrar na mecânica da teologia. Iniciando uma longa visita à fábrica teológica não com a finalidade de comprar a teologia pronta, mas de entrar em contato com os que a produzem: operários, gerentes... e assim aprender como se produz. Não basta estudar teologia ou praticá-la de modo espontâneo na vida. É importante aplicar-se mais demoradamente no estudo das regras internas que vão se clareando na medida em que ela é estudada. “O fato de aprender teologia com a intenção crítica de conhecer-lhe as entranhas prepara o aluno para fazer teologia no sentido técnico do termo”.[9]
2.4 - Celebrar e rezar a teologia – nessa quarta dimensão são muito importantes as palavras: coração que em latim é “cor” e em hebraico é “leb”, juntamente com as palavras conversão e vida, pois para poder celebrar e rezar a teologia temos que localizá-la ou situá-la em seu autêntico lugar, mas qual seu lugar?
A teologia “nasce da fé da comunidade e orienta-se para a fé”.[10] E no centro de toda teologia está o mistério de Deus, o Mistério Pascal. E as palavras fortes, acima citadas, são os caminhos pelo qual se deixa penetrar esse mistério de Deus na teologia orada, rezada e celebrada. Essa é uma visão pascaliana, ou seja, elaborada por Blaise Pascal, matemático, filósofo e teólogo francês 1623-1662, sem essa dimensão a teologia pode se tornar seca, árida, e apenas um discurso no plano do logos, do intelecto ou do puro abstracionismo.
Não é possível fazer teologia sem uma experiência mística. O teólogo é alguém que se sente e realmente deve estar apaixonado por Deus. Um Deus que se deixa experimentar, nesse sentido o coração do teólogo é atraído por Deus, isso é fazer teologia de joelhos diante do imenso Mistério de Deus. “A liturgia, de fato, é a teologia rezada, celebrada. ‘lex orandi, lex credendi, lex theologandi’: a lei de orar é a lei de crer e de fazer teologia”.[11]
2.5 - O Resultado do Estudo Depende do Processo
O resultado de todo estudo de teologia vai depender de cada um que a estuda, suas motivações, animações e intenções. O aluno deve saber se quer uma teologia onde apenas se compra o produto ou fazer uma teologia, de forma, que se adentre na fábrica teológica e descubra o seu interior. É necessário que se deixe seduzir pela teologia para assim ser um teólogo.
O estudo da teologia, portanto, requer uma viagem por todo o processo de desenvolvimento. Não basta aprender apenas uma parte da teologia ou apenas uma corrente teológica.
Para que tal estudo da teologia possa ser bem desenvolvido, supõe-se que durante o curso da teologia o aluno e os professores vão trabalhando os conteúdos teológicos de maneira crítica – aprender/ensinar teologia - ao localizá-los devidamente em sua fábrica teológica – aprender a fazer teologia – e também articulando-os com as novas questões surgidas sobretudo das experiências pastorais de ambos – fazer teologia. Além disso, quer o aluno, quer o professor, tanto em nível pessoal como mesmo enquanto comunidade acadêmica, terão seus momentos de celebrar e rezar a teologia.[12]
A pastoral encontra grande participação na teologia, pois ela gera perguntas e também respostas que auxiliam a se “repensar e a testar a própria teologia ensinada/aprendida, e assim se aprende a fazer teologia”.[13]
Ao “aprendiz de teólogo”, enfim, impõe-se esses desafios de aprender, aprender a fazer, de fazer e de celebrar a teologia.
3 - Conceito de Teologia
3.1 - A Origem do Termo
Como sabemos nosso mundo é o mundo da palavra temos, pois, a palavra falada, interpretada, cantada, encenada, desenhada entre outras maneiras. A palavra, contudo, paga um preço pelo seu tempo histórico, ou seja, paga algo pelo seu atributo etimológico (etimologia). Usando o exemplo de nossos autores nas palavras ficam os resquícios e marcas de sua origem. Como, por exemplo, os genes do pai e da mãe estão sempre presentes nos filhos.
Teologia possui o composto de dois termos: Théos = Deus + Lógia = ciência, forma-se, portanto, ciência de Deus, tratado de Deus, estudo de Deus.
Deus é o centro de qualquer reflexão teológica, pois ela de alguma maneira se refere a Ele. Por isso se pode afirmar que a teologia tem como objeto material Deus e o seu objeto formal é o aspecto particular sob o qual ela considera seu objeto material.
Por exemplo, o homem pode ser objeto material de várias ciências: filosofia, sociologia, psicologia, antropologia... Cada uma dessas ciências, no entanto, encara o homem sob um aspecto diferente.
Teologia tem a ver com ‘logia’, com palavra, com saber, com ciência. Coloca-se Deus em discurso humano. Etimologicamente significa um discurso, um saber, uma palavra, uma ciência de ou sobre Deus. [14]
Há algumas palavras parecidas com teologia, nesse sentido, convém apontá-las.
3.1.1 -Teodicéia – termo criado por Leibniz, 1646-1716, e que serviu de título a uma de suas obras. Quer dizer, em suma, conjunto de doutrinas que procuram justificar a bondade divina contra os argumentos tirados da existência do mal no mundo, refutando as doutrinas atéias ou dualistas que se apóiam nesses argumentos.
3.1.2 -Teofania – esse termo que significa visão de Deus foi usado por Scotus Erígena, século IX, para indicar o mundo como manifestação de Deus.
3.1.3 - Teogonia – geração dos deuses e do mundo: cosmologia mítica.
3.1.4 -Teosofia – determinado tipo de conhecimento de Deus que remonta a uma especulação filosófica de raiz mítica, refere-se ao estudo especulativo da sabedoria divina e, em sua forma vulgar, a forma do ocultismo relacionado com religiões do extremo Oriente.
3.2 - Os Diferentes Usos do Termo na História
Ao longo da história a palavra teologia possuiu um determinado sentido. Um primeiro paradoxo é que a palavra teologia que no ocidente se vinculou á tradição bíblico-cristã, não encontra na Bíblia seu nascimento semântico. Em seu lugar na Bíblia se encontra “Palavra de Deus” (cf. Lc 8,21).
Fazendo a leitura do texto (2Tm 3,16) encontramos os inspirados de Deus, e em (1Ts 4,9) os aprendizes de Deus, mas não os teólogos.
O termo teologia pode não aparecer de forma explicita nos textos bíblicos, mas aparece de maneira implícita como podemos encontrar na Epístola de São Pedro quando recomenda aos seguidores de Cristo, a saberem justificar a fé perante o tribunal (cf. 1Pd 3,15), ou seja, convida a fazer teologia. Podemos encontrar Jesus no Evangelho segundo São Mateus (cf. Mt 16,13) questionando o povo e fazendo com que eles fizessem teologia. “E vós que dizeis que eu sou?”. “No fundo, a comunidade se faz a pergunta teológica sobre Jesus Cristo. Não se usa, porém o termo teologia, que naquele momento não viria bem para uma reflexão sobre Jesus Cristo”. [15]
Foi no mundo grego que o termo teologia lançou suas raízes, pois nos teatros gregos havia acima do palco um lugar chamado “theologeion” onde apareciam os deuses. Esse verbo “theologéo” significava o discursar sobre os deuses. Teologia exprimia a ciência das coisas divinas. O teólogo era aquele que falava sobre os deuses ou sobre os poetas como Hesíodo e Orfeu.
Platão usava o termo para exprimir o discurso sobre deus ou os deuses. Aristóteles delimita para o campo do saber. A filosofia primeira que tratava as causas necessárias, eternas e imutáveis, hoje chamamos metafísica o estudo do ser enquanto ser.
O sentido pagão foi considerado na teologia latina cristã antiga, nesse sentido Agostinho se referia a ela como fábula: “três são os gêneros da teologia, isto é, da razão que dá explicação sobre os deuses: um tipo dela é mítico, outro físico (natural) e o terceiro civil”.[16]
A teologia foi aceita como ciência de Deus pelo cristianismo, “assumindo assim a acepção cristã de discurso sobre Deus e Cristo” [17], a partir do século IV pela Patrística Grega isso contou com o auxílio de Orígenes e Eusébio. A Patrística assume o termo para o discurso sobre o Deus verdadeiro, sobre a trindade.
Abelardo (1079-1142), por sua vez, no mundo latino usa o termo para se referir ao tratado sobre Deus enquanto se utilizava ‘beneficia’ para a teologia sobre Cristo. A escolástica, no entanto, preferiu outros nomes para a teologia “doctrina christiana”, “doctrina divina”... Santo Tomás (1225-1274) toma uso mais dos termos “sacra doctrina” ou “doctrina cristiana”, mas muito raramente usava teologia.
A teologia assume o lugar da “sacra doctrina” entre São Tomás e Escoto (1266-1308). Na Idade Moderna surgem outros aspectos da teologia: teologia mística, teologia ascética, teologia moral, apologética, teologia positiva e teologia escolástica. Da antiga teologia o que restou foi a teologia que hoje se chama dogmática ou sistemática.
3.3 - Intelecção do Termo
(...) teologia define-se como reflexão crítica, sistemática sobre a intelecção de fé. E a fé termina em Deus e não nos enunciados a respeito de Deus, como muito bem explica São Tomás. ‘actus credentis non terminatur ad enutiable, sed ad rem’ o ato do que crê não termina no enunciado, mas na coisa.[18]
A fé é fundamental para o estudo da teologia, pois não há teologia sem o dado da crença em um Deus que se revela e liberta o seu povo (Ex 3,7), enfim, sem fé não se faz teologia. (cf. Rm 10,14-15.17).
Texto para reflexão extraído do livro: “introdução à teologia” p. 70-71:
3.4 - O espírito e a esposa
“Se a teologia é pensamento do encontro entre o humano caminhar e o divino vir, o sujeito dela, em sentido próprio e fontal, só pode ser Aquele que neste encontro tem a iniciativa absoluta: o Deus vivo e santo. É ele que, vindo ao homem, suscita também a abertura da criatura ao mistério, é ele que, amando, nos torna capazes de amar, e, conhecendo, abre os olhos da mente de quem por ele é conhecido. ‘Deus sempre prior!’: Deus vem sempre em primeiro lugar. É ele a eterna pré-suposição de toda possível iniciativa do êxodo, de toda via que, da morte, se abre à vida, é ele o criador e o redentor do homem. Por pura gratuidade, sem ser de nenhum modo constrangida, sua Palavra é saída do eterno silêncio do diálogo sem fim do amor; ela ‘se fez carne’ (Jo 1,14) a fim de tornar-se acessível e comunicável ao homem. E tudo o que nela nos foi dado de invisível, de inaudito e de impensável, é o Espírito que o faz presente para nós: ‘O que os olhos não viram, os ouvidos não ouviram e o coração do homem não percebeu, isso Deus preparou para aqueles que o amam. A nós, porém, Deus o revelou pelo Espírito. Pois o Espírito sonda todas as coisas, até mesmo as profundidades de Deus... Quanto a nós, não recebemos o espírito do mundo, mas o espírito que vem de Deus, afim de que conheçamos os dons da graça de Deus’ (1Cor 2,9s.120).
Todos (os cristãos) recebem o dom da verdade e da vida e todos devem generosamente transmiti-los: é uma tradição apostólica da Igreja, que compromete na recepção, bem como na transmissão ativa do advento divino, todo o povo dos peregrinos de Deus...
O teólogo é aquele que – pelo carisma recebido do espírito e pelo reconhecimento e recepção da comunidade – se esforça para levar à palavra de maneira orgânica e acabadamente reflexiva e vivência pessoal e coletiva da experiência do advento divino. Ele ‘pertence à massa e possui a palavra’ (C.L. Milani): como tantos outros, ele é crente que experimentou o dom do encontro, que lhe mudou a vida; com estes outros – povo da Palavra escutada, proclamada e crida – ele se sabe ligado por vínculos de profundíssima e concreta comunhão, articulada no tempo e no espaço; a seu serviço ele põe a inteligência e seu coração, enamorado do seu mistério e também consciente dos limites que lhe são próprios. Como Tomás, ele confessa: “Eu que a tarefa principal da minha vida seja a de expressar Deus em toda palavra e em todo meu sentimento” (Bruno Forte, A teologia como companhia, memória e profecia, São Paulo, Paulinas, 1991, 134, pp. 135,137).
4 - Teologia Originante
Ao ler o Novo Testamento podemos notar que são relatos de fé e também de reflexão sobre a fé, pois são escritos que possuem grande esforço para explicar, revelar, mostrar e responder perguntas sobre Jesus, sobre sua encarnação, vida, morte e ressurreição, nesse sentido a primeira geração do nosso século foi a que realizou a “verdadeira teologia”.
Há certa negação de alguns de que o Novo Testamento seja um conjunto de escritos teológicos, pois questionam como pode ser teológica a fonte da teologia? Ou seja, ser manancial de si mesmo.
Mas há um erro nessa indagação, porque não se pode entender o conceito de teologia que temos hoje aplicado àquela época é anacrônico. Então se pode afirmar que:
O Novo Testamento é teologia fontal, paradigmática e estimuladora de toda e futura teologia, ao mesmo tempo que sua base irrenunciável, simultaneamente é a ‘teologia do principio’ (K. Rahner) e o principio da teologia.[19]
Essa teologia pode ser caracterizada por estes elementos:
Pneumática, embebida pelo Espírito que suscita a continuidade dos seguidores de Jesus.
Eclesial, nascida no seio vivo de uma comunidade a caminho e referida a ela.
Missionária, destinada a transmitir e recriar a fé cristã.
Vivencial, repleta de sentimentos, conotações afetivas e força convocatória, proveniente da experiência de seguimento do ressuscitado.
Contextualizada na história da comunidade em que foi elaborada. Não retrata desejo explicito de fazer reflexão única e universal, válida igualmente para todos como “anamnese da Palavra”, torna presente o dado revelado em suas diversas situações. Cria unidade como solidariedade entre os diferentes.
Aberta ao futuro, estimulando assim interpretações enriquecedoras, novas releituras situadas. [20]
5- Teologia Patrística
A era Patrística (idade) no Ocidente se encerra em 604 (S. Gregório) e em 636 (S. Isidoro) e no Oriente em 749 (S. Damasceno).
A teologia patrística é de fundamental importância para o estudo da teologia. Ela abarca o período que vai da geração dos Padres Apostólicos que tiveram contato como os apóstolos são eles Clemente Romano, Inácio de Antioquia, Policarpo, Papias, Hermas. Tendo como período total seis séculos até a teologia medieval.
Dentro da patrística temos os:
Padres da Igreja características: antiguidade, ortodoxias do ensino, aprovação expressa ou implícita da Igreja e santidade. Santo Atanásio, São Gregório Nazianzeno…
Padres apostólicos, já vimos acima.
Escritores eclesiásticos: viveram na mesma época, mas carecem de ortodoxia e santidade
Tertutiano (de Cartago), Orígenes, Eusébio de Cesareia
Textos de Tertuliano
Fora todas as tentativas de elaborar um cristianismo enfeitado com os elementos procedentes do estoicismo, do platonismo e da dialéctica! Não temos necessidade de discussões intrincadas, porque temos Jesus cristo: nem temos curiosidade, porque temos o Evangelho. Possuindo a nossa fé, não desejamos nenhuma outra ciência.
In “Prescrição contra os hereges”
“Será permitido ao cristão viver de espada na mão, quando o Senhor afirmou que quem se servir da espada morrerá pela espada? Há-de ir ao combate o filho da paz, ao qual está mesmo interdita a disputa? (...) Há-de fazer guarda diante dos templos aos quais renunciou? (...) Há-de levar o estandarte rival de Cristo?
In “A Coroa dos Militares”
Tertuliano introduz o termo trinitas (trindade).
Aderiu ao montanismo (Montano: padre da Ásia Menor). Movimento herético cristão, surgido na segunda metade do séc. II. Esperavam o iminente regresso de Cristo á terra, pelo que viviam com o mais rigoroso ascetismo. Davam mais valor aos profetas carismáticos do que aos bispos. Importante presença feminina no movimento.
Tertuliano, no início pensa que os pecados graves podem ser perdoados uma vez na vida. Quando adere à seita, considera que alguns, como o adultério, jamais poderão ser perdoados em vida.
5.1 - O contexto Histórico
No seu início o cristianismo enfrentou muitos desafios dentre eles se destacam dois o primeiro de traduzir para cultura helênica sua Boa Nova e o segundo o de justificar a fé perante a filosofia grega que considera isso como secundário.
Sendo superado esses desafios surgem outros, pois depois de muitas perseguições políticas o Império Romano com Constantino reconhece o cristianismo e por isso se da uma grande expansão da fé cristã por todo o Império Romano.
Fonte: http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=80
Esse processo de aceitação e expansão gera dois novos desafios o primeiro de evitar que a Igreja helenize sua doutrina e o outro é o de secularizar-se entrando nas estruturas do Império Romano deixando as honras e privilégios tomar o lugar do serviço evangelizador.
Contra esses riscos “os padres respondem a este desafio, mantendo o fermento evangélico nos aspectos existencial, práxico e intelectivo”.[21] Esse é um pouco do contexto em que nasce a Patrística.
5.2 - Caracterização da Teologia Patrística
A Patrística conta com dois principios: “Intellige ut credas, crede ut inteligas”: crer para entender, entender para crer, Santo Agostinho (354-430).
Não há uma separação entre fé e razão os padres patrísticos encheram na teologia uma “anagogia”, ou seja, subida rumo ao mistério de Deus. “Os protagonistas da teologia patrística, bispos, sacerdotes e leigos, elaboram reflexões de fé de cunho predominantemente pastoral”.[22]
Com essa afirmação podemos pensar que eram pessoas que estavam próximas ao povo que não eram sedados em relação necessidade espiritual, pastoral, litúrgica de sua época e fruto dessa proximidade são os escritos voltados às comunidades e também os de caráter mais intelectuais voltados para intelectualidade da época.
No início do século III surgem as primeiras “Escolas Teológicas” dentre elas as mais conhecidas são a de Alexandria e de Antioquia.
Segundo nossos autores a reflexão de fé dos padres é marcadamente bíblica, litúrgica, crístico eclesial, inculturada e plural.
Bíblica – a Palavra de Deus escrita era vista como capaz de mudar a vida de seus receptores. Esse é um pressuposto fundamental para a teologia patrística. Predominava o modo de leitura simbólica da Bíblia-Escritura. Isso contou com alguns exageros.
Litúrgica – por ser a celebração litúrgica ponto central da fé cristã onde a comunidade se reunia para celebrar a vida. A teologia dos padres nasce do encontro litúrgico, pois havia uma busca de explicação do conteúdo da fé expresso na liturgia. A liturgia se desenvolve antes da sistematização teológica.
Há, portanto, na patrística, dupla ligação entre teologia e liturgia. Na celebração litúrgica nasce a homilia, e da homilia a exegese dos textos bíblicos. A liturgia como ‘locus theologicus’ e teologia primeira, discurso dirigido a Deus, alimenta, expressa e faz-se norma da fé e de sua intelecção. A teologia, por sua vez, desemboca na expressão de louvor e adesão a Deus, especialmente na liturgia.[23]
Crística e eclesial – Jesus Cristo em relação à comunidade é a chave de leitura dos dados da fé. No período patrístico a reflexão da fé se dava por meio da comunidade e não apenas nos textos, pois seria algo limitado. Por isso a maior parte da produção teológica emerge da vida comunitária.
Criativa, inculturada e plural –
“A patrística marca a ingente tarefa de inculturação de fé cristã no helenismo. A igreja vive um período de criatividade e expansão. Abre espaço dentro de um mundo altamente civilizado e dotado de grande cultura intelectual”.[24]
São padres ousados que buscam construir uma teologia que seja verdadeira e abrangente.
Reler e aprofundar os dados da fé cristã, formulados originalmente com categorias hebraicas, na pauta da cultura helenista, longe de constituir desvio de identidade cristã caracteriza a mais bem sucedida experiência de inculturação da teologia e do próprio cristianismo. [25]
Século
Tendência Hegemônica / Fase
Nomes Principais
I-II
Padres Apostólicos
Clemente, Inácio, Policarpo, Didaché
II
Apologistas
Justino, Taciano, Teófilo, carta a Diogneto
II-II
Reflexão Sistemática
Tertuliano, Orígines, Ireneu, Hipólito
III-IV
Escolas Teológicas
Alexandria: Atánasio, Cirilo. Capadócia: Basílio...
IV-V
Fase de Esplendor
Agostinho, Jerônimo, Ambrósio, Leão Magno, Efrém.
VI-VII
Final
Gregório Magno, Isidoro de Servilha, Boécio, João Damasceno.
Os padres, de fato, realizaram com muita austeridade as funções de bispos, místicos, teólogos e missionários.
6 - Teologia Escolástica
A escolástica atravessou oito séculos sendo dividida em três fases: transição e gestação da dialética, a grande escolástica e a escolástica tardia. A escolástica seguia Agostinho no sistema neo-platônico, mas logo assume a posição aristotélica.
Gestação – vai do século VII ao X período marcado por uma estagnação da sociedade e da Igreja. “A teologia limitava-se à leitura e ao comentário da Escritura”.[26] E havia um empobrecimento dos textos patrísticos.
Inícios – a teologia entre os séculos X e XII se vê impulsionada pelo surgimento de ordens religiosas, movimento de ordens mendicantes... E também nascem as universidades. Os escritos aristotélicos são descobertos entre 1120 e 1160.
Eles moldam nova mentalidade: ‘o pensamento pelo confronto resultante da aproximação dialética de negação e afirmação, amadureceu nesta sociedade em mutação, caracterizada pela multiplicação dos intercâmbios.[27]
Essa entrada da dialética gera um conflito entre o tradicional e o inovador. São Bernardo de Claraval, que era da teologia monástica, combatia as idéias inovadoras de, por exemplo, penetrar nos mistérios divinos com o uso da dialética. Já Abelardo faz o caminho inverso tomando uso do método dialético “sic et non”: sim e não. O método dialético foi consagrado no “Livro das Sentenças” de Pedro Lombardo.
Já Anselmo une a teologia monástica agostiniana, favorável à absoluta suficiência da fé, ao pensamento especulativo dialético. Trabalha para transformar a verdade crida em verdade sabida, pensada e expressa. A fé em busca de inteligência (“fides quaerens intellectum”): ‘Não pretendo, Senhor, penetrar a tua profundidade, porque de forma alguma minha razão é comparável a ela; mas desejo entender de certo modo a tua verdade, que o meu coração crê e ama. Não busco, com efeito, entender para crer, mas creio para entender’. [28]
Chega-se, por fim, ao grande cisma na escolástica entre o Oriente e o Ocidente em volta de (1054) Miguel Cerulério sela essa separação.
Tudo isso, pois a teologia Ocidental optou pela dialética e a Teologia Oriental não assimilando a dialética se conserva com os traços contemplativos e simbólicos, ficando com uma teologia apofática, misteriosa, e defende que nenhuma definição humana consegue abarcar a Deus e seu mistério.
Seis elementos que se distinguem no ensino da escolástica:
Lectio: explicação do mestre. Os estudantes devem reter informações na memória.
Commentarium: exegese das grandes obras dos mestres do passado.
Quaestio: desenvolvimento dialético, submetendo determinada afirmação à elaboração crítica.
Disputatio: estudantes e mestres discorrem juntos sobre temas e pensamentos de determinado autor ou obra.
Quodlibet: extensão da disputatio. Discussão livre sobre qualquer espécie de assunto.
Sententiae: retomada em sumas teológicas.
Esplendor da Escolática – a teologia passa a ser ensinada nas universidades, os professores e alunos trabalham metodicamente, criticamente e usam o raciocínio dialético, muita coisa é escrita e, por fim, se difunde as obras de Aristóteles: Metafísica, Política, Tratado da Alma.
Tomás de Aquino, a figura máxima e insuperável da escolástica combina rigor teórico, criatividade e ousadia. Desenvolve uma teologia obediente à revelação, que responde as exigências da epistemologia aristotélica a ponto de, em decorrência, dizer-se ciência. [29]
Ele deixou muitas obras dentre elas se destaca a “Suma de Teologia”.
Esse período também contou com outras teologias: monástica e a escola franciscana que não tratava a teologia como ciência.
Século
Etapa
Corifeus / Mestres
VIII-X
Gesação
---------------
XI-XII
Inícios
Anselmo de Cantuária, Pedro Abelardo, Pedro Lombardo
XIII
Alta Escolástica
Escola Dominicana: Alberto Magno, Tomás de Aquino, Mestre Eckart
XIV-XV
Escolástica Tardia
Escola Franciscana: Boaventura, Duns Escoto, Guilherme de Ockham, Gabriel Biel
7 - Teologia Antimoderna e Manualística
Início do protestantismo, séc. XIV idade moderna, um novo sentido na teologia, início do capitalismo, um novo sentido de economia.
Séc. XVIII e XIX
A partir daí as transformações são muito maiores, com muitas revoluções, e a que mais marcou foi a Revolução Francesa, que queria uma igualdade e fraternidade mundial. Depois disso começa-se a mentalidade urbana, que até então não existia, temos a partir daí a revolução industrial.
A teologia assume então uma posição contrária a tudo isso.
A Igreja começa a trabalhar a teologia só para os padres, porque não quis se misturar com nenhuma forma de pensamento.
Cria-se então, uma doutrina para o povo, como: quem é Deus? E o saber da teologia era elaborado para os padres formando manuais de catecismo, este tipo de teologia durou até o Concilio Vaticano II (1960-1964).
8 - Teologia Latino-americana da libertação
Como já foi dito, acima, a teologia paga tributos, ou seja, não está neutra perante a realidade em que ela nasce, nesse sentido a máxima de que a teologia nasce dentro de um contexto específico, seja ele político, social, cultural... é válida.
Segundo nossos autores a teologia da libertação paga tributos a dois fatores:
Primeiro, pois nasce em um determinado contexto social e histórico.
Segundo, porque está situada dentro de movimentos de idéias e de elementos culturais.
Para os autores (teólogos) de corte idealista a teologia se faz por meio de um processo de influencia ideológica onde teologia gera teologia. Já os de corte prático possuem uma maior sensibilidade pastoral e fazem uma relação das idéias, a teologia como contexto político-econômico.
8.1 - Situação Sócio-política e Econômica
Situação de dominação e opressão
Depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) há um avanço do capitalismo, mas na Europa e em alguns países de liderança cristã o neocapitalismo assumiu uma face mais humana. Isso se deu devido as lutas operárias as “...intervenções do Estado na regulação e promoção do desenvolvimento social.”[30]
Nesse processo ocorreu uma condição social mais favorável aos cidadãos com melhoras na higiene, salário, enfim, reduziu-se a desigualdade social e o surgimento de ampla classe média que deu maior coesão à sociedade.
O neocapitalismo, no entanto, trouxe conseqüências não muito favoráveis aos países pobres, pois com toda coesão e alegria dos países ricos não existiu uma preocupação em olhar os países periféricos “(...) que viviam verdadeira forma selvagem de capitalismo tardio e dependente.”.[31]
Por conta de toda essa dependência que se postulou ao Terceiro Mundo dois sociólogos latino-americanos, Fernando Henrique Cardoso e E. Faletto elaboraram uma teoria da dependência e da libertação sendo elas contrárias a teoria do desenvolvimento. Com a criação dessas teorias surge o termo libertação, mas em um contexto político-econômico.
A teologia da libertação pretende responder teologicamente à pergunta da libertação dos povos dependentes em relação aos países centrais, das camadas dependentes diante das estreitas faixas da sociedade ricas e desenvolvidas. [32]
8.1.1 - Movimentos de Libertação
O termo, portanto, libertação ajudou a teologia a não ficar apenas na dimensão da dependência e opressão, mas a levou a um processo redentor. Não caindo assim em uma “teologia da resignação, da cruz, do sofrimento”. [33]
8.1.2 - Presença da Igreja
No decorrer da história humana existiram muitas opressões e muitas lutas por libertação, no entanto, nunca uma teologia da libertação que pusesse à tona a problemática da fé.
A América Latina pode contar com essa teologia, pois ela estava dentro dos movimentos de libertação, por isso a grande importância da presença da Igreja nesse meio. E foi nesse contexto que nasceram várias perguntas da TdL.
Essa participação da Igreja nos meios de libertação foi possível por conta da abertura da própria Igreja à dimensão “sócio-transformadora”, nesse sentido se fez de base as encíclicas de João XXIII: Mater et Magistra e Pacem in Terris; o Concilio Vaticano II; parte dos bispos do Brasil e de outros países, por fim, no meio jovem a Ação Católica JEC, JUC e JOC. Nos meios rurais as Comunidades Eclesiais de Base (CEB´s).
Portanto, a confluência desses três vetores – situação de dominação, movimento de libertação e presença da Igreja – permitiu que surgissem novas perguntas. E a novas perguntas correspondeu nova teologia. Recebeu o nome de teologia da libertação, porque abordava a temática da libertação. Mereceu o nome de teologia por que versava sobre a fé cristã. Surgiu na América Latina, porque ai se encontrou uma Igreja inserida e em reflexão dentro da situação opressora trabalhada por surtos libertários. [34]
8.2 - Situação Cultural e Teológica
A teologia segue por meio da esteira das outras teologias, isso sem cair no processo idealista, e por isso dentro desse processo vai se dinamizando.
Há, nesse sentido, a teologia escolástica de cunho dedutivo, ou seja, da fé para o homem, de modo que primeiro se estabelecia os princípios da fé depois vinha deduzindo as verdades que deveriam ser aceitas.
E a teologia moderna que parte do método indutivo, ou seja, faz uma interpretação da teologia a partir das experiências de sua época (modernidade). Essa teologia dá fundamento para a TdL.
O horizonte da modernidade parte do sujeito que crê e não da doutrina em que se crê. Diferentemente do método dedutivo, que parte da doutrina já possuída e estabelecida e procura em seguida ampliar-lhe a compreensão, a TDL trabalha o método indutivo do pensamento moderno, da experiência humana, para, com nova compreensão da revelação, poder respondê-las.
8.3 – Estrutura da Teologia da Libertação
Algo que é diferente na TdL é o modo como aponta a relação, pois não cai na tentação de esquecer a realidade latino-americana que está marcada pela tensão da dominação e da libertação.
8.3.1 – Pontos de Partida
Toda teologia nasce de novas perguntas o mesmo se da na TdL, contudo ela não pode se tornar mera atividade intelectual, pois o teólogo que a faz deve usar como plataforma teológica a sua própria realidade comunitária.
A teologia da libertação nasce para os pobres e com os pobres faz acontecer a libertação nesse modo de fazer teologia deve haver a tomada de consciência da miséria, opressão, exclusão e marginalização. Sendo assim há uma forma muito forte de se realizar o projeto de Deus. “E a Teologia da Libertação procura ver o sentido teologal, transcendente de todo esse processo”. [35]
Se a situação histórica de dependência e dominação de dois terços da humanidade, com seus trinta milhões anuais de mortos de fome e desnutrição, não se converte no ponto de partida de qualquer teologia cristã hoje, mesmo nos países ricos e dominadores, a teologia não poderá situar e concretizar historicamente seus temas fundamentais. Suas perguntas não serão perguntas reais... Por isso é necessário salvar a teologia de seu cinismo. Porque realmente, diante dos problemas do mundo de hoje, muitos escritos de teologia se reduzem a um cinismo. (H. Assmann, tirado de: J.J. Tamayo-Acosta, Para compreender la teología de la liberación, Estella, Verbo Divino, 1991, p. 140).[36]
8.3.2 – Articulação com a Prática
A teologia da libertação corre o risco de se tornar apenas uma bandeira ideológica se não estiver em sintonia com o pobre e com a prática da caridade.
8.4 - Três Momentos da TdL
8.4.1 - Momento pré-teológico
Esse é o momento em que o teólogo não parte apenas para o lado emocional, mas faz um trabalho de cunho cientifico usando das “mediações socioanalíticas” - MSA que ajudam a uma visão mais nítida da realidade do pobre que é o ponto central da teologia da libertação.
Nesse caso a teologia toma posse de elementos de outras ciências sem deixar de ser teologia, o teólogo não está sendo enganado pela (MAS), mas a está usando com uma visão crítica onde há o confronto com a revelação de Deus.
8.4.2 - Momento Teológico
Depois de realizada a visão crítica é necessário o teólogo levantar o problema e com a sua pergunta elaborar um dado da sociedade que deve ser transformado ou não. Essa problemática é posta ao lado da Palavra de Deus em um processo dialético libertador.
O momento teológico tem, portanto, como resultado uma compreensão iluminada pela fé da problemática carregada da América Latina e uma interpretação nova da Palavra de Deus, também ela influenciada por essa problemática. Em relação à Palavra de Deus, pode-se incorrer em duplo equívoco: determinismo sociológico ou dogmatismo transcendentalista.[37]
8.4.3 - Momento Práxico
Com uma acentuação na dimensão critica da práxis nasce a Teologia da Libertação, pois ela é uma teologia da práxis. “Toda teologia é sabedoria, saber racional e reflexão critica da práxis”.[38]
Essa tríplice função teológica pode ser posta da seguinte forma:
Patrística = Sabedoria
Escolástica = Saber racional
TdL = Reflexão crítica da práxis
Mesmo podendo ser divididas pedagogicamente em uma teologia possuindo tal característica, elas devem estar presentes em todas, claro que isso não impede que uma se expresse mais que outras.
Exercer a crítica da própria prática teológica é o papel que a TdL quer lograr, nesse sentido temos três níveis de práxis a serem “criticadas”: prática intrateológica, intraeclesial e sócio política.
Prática Intrateologica – está relacionada as próprias categorias teológicas. A crítica nesse sentido surge como uma maneira de descristalizar algumas categorias teológicas e assim tornar essas categorias mais próximas da realidade.
Assim, p. ex., o termo teológico “graça” pode aparecer por demais ligado ao universo fisicalista da “forma animae” – forma da alma -, ou dilatar-se ao campo interpessoal de ‘amizade com Deus e fraternidade” e finalmente receber um toque da TdL que o liberte para o campo do compromisso histórico com os pobres. Então surge o conceito de “graça libertadora”, que quer ser uma reelaboração intrateológica de um conceito básico da teologia.”[39]
Prática Intraeclesial - essa se da na comunidade com o estudo das práticas comunitárias e as dimensões hierárquicas da Igreja. É uma forma de se construir uma “eclesiologia militante”. Aqui se trabalha muito as Ceb´s.
Prática Sociopolítica – essa está relacionada, como o nome já diz, com as práticas sociais, de fato, isso é constante na Teologia da Libertação.
8.5 - Teologia da Libertação e Práxis
Neste trecho cito literalmente o texto de nossos autores que vai da página 184-185.
Resumindo de modo didático, a TdL é uma:
- teologia da práxis
- teologia para a práxis
- teologia na práxis
- teologia pela práxis
a. Teologia da práxis: pois esta teologia haure seu material de reflexão da prática intrateológica, ou intraeclesial ou sociopolítica. A prática oferece a matéria-prima da TdL.
b. Teologia para práxis: o produto teológico, o fruto da elaboração teológica – confrointo do material assumido da prática com a revelação – se orienta a iluminar a prática teológica intraeclesial ou sócio política. Devolve-se à prática do fiel ou do cidadão o material assumido da prática depois de ter sido trabalhado sob o ângulo especificamente teológico, isto é, à luz da Revelação.
c. Teologia na práxis: o teólogo que faz a reflexão deve, de certo modo, estar articulado com a prática que reflete e para a qual reflete. Supõe-se dele uma opção que deve ultrapassar simplesmente o interior do coração para concretizar-se num mínimo de prática concreta de libertação junto aos pobres. Um mínimo de alternância entre a pura prática teórica teológica e a prática pastoral junto das camadas populares faz-se mister para elaborar verdadeira TdL.
d. Teologia pela práxis: uma vez terminada a tarefa teológica de ter interpretado à luz da revelação as práticas pastorais e sociais e ter devolvido o produto teológico aos interessados, estes submetem-no à sua crítica. A partir deles julga – não como único -, mas como verdadeiro critério, se a tarefa teológica foi bem executada ou não. Se a teologia ajuda no processo de libertação dos pobres em seu verdadeiro sentido concreto e a manutenção dos valores teologais nesse processo, ela é boa teologia. Assume-se o célebre critério da “ortopráxis”, somente que esta não deve ser entendida unicamente como eficiência prática, mas também, e de modo especial, como conservação da fé nessa prática.
Se, na verdade, a TdL se caracteriza por essa relação privilegiada, quádrupla com a práxis, não pode contudo ser reduzida unicamente a ela. Como se disse acima, ela deve ser, como toda teologia, sabedoria e saber, oração e doutrina, contemplação e conhecimento, além dessa significativa relação com a práxis.
9 - Disciplinas Teológicas
Muitas são as disciplinas teológicas, mas o importante é saber que todas nascem da necessidade existencial do próprio homem que busca respostas as suas interrogações em relação a Deus, a vida, a morte, a graça entre outros dados da existência.
Por ser um tema muito vasto as definições apresentadas serão breves. Que sirvam para estimular a um maior aprofundamento.
Teologia Fundamental: lança as bases do conhecimento teológico.
Teologia Bíblica: dedica-se ao estudo bíblico e suas demais necessidades.
Teologia Moral: da base para as reflexões éticas ao pensa o homem e seus deveres morais.
Teologia Sistemática ou Dogmática: trata-se de tornar compreensíveis os dogmas da fé por meio de uma visão voltada para a vida.
Teologia Litúrgica: ajuda os fiéis a uma maior compreensão da liturgia como uma dimensão presente em toda a vida.
Entre várias outras.
Conclusão
A teologia deve ser vivida e tida como instrumento de sabedoria e de encontro com o Deus da vida.
Bibliografia
BOFF, Leonardo. Os sacramentos da vida e a vida dos sacramentos / mínima sacramentalia. Petrópolis-RJ: Vozes, 1999. 20°ed.
LIBANIO, J.B; MURAD, Afonso. Introdução à teologia: perfil, enfoques, tarefas. São Paulo: Loyola, 1996. 3°ed.
PRETO, Hemillo. A teologia tem algo a dizer ao ser humano. São Paulo: Paulus, 2003
[1] Formando em Filosofia pela UNIFAI.
[2] PRETO, Hemillo. A teologia tem algo a dizer ao ser humano, p.6
[3] BOFF, Leonardo. Os sacramentos da vida e a vida dos sacramentos / mínima sacramentalia. p. 9
[4] Söran Kierkegaard, filósofo dinamarquês nasceu em 5 de maio de 1813 em Copenhague e faleceu n o ano de 1855.
[5] LIBANIO, J.B; MURAD, Afonso. Introdução à teologia: perfil, enfoques, tarefas, p.17.
[6] Ibid., p.36.
[7] Ibid., p. 58.
[8] Ibid., p. 58.
[9] Ibid., p. 59.
[10]Ibid., p.59.
[11]Ibid., p.59.
[12] Ibid., p.60.
[13] Ibid., p.61.
[14]Ibid., p.63.
[15] Ibid.,p.64.
[16] Ibid.,p.66.
[17] Ibid.,p.66.
[18] Ibid.,p.67.
[19] Ibid.,p. 112
[20] Ibid.,p.114
[21] Ibid., p.116
[22] Ibid., p.118
[23] Ibid.,p.121
[24] Ibid.,p. 122
[25] Ibid.,p.123
[26] Ibid.,p.127
[27] Ibid.,p.128
[28]Ibid.,p.128-129
[29] Ibid.,p.130
[30] Ibid.,p.162
[31] Ibid.,p.162
[32] Ibid.,p.163
[33] Ibid.,p.164
[34] Ibid.,p.167
[35] Ibid.,p.173
[36] Ibid.,p.173
[37] Ibid.,p. 179
[38] Ibid.,p.182
[39]Ibid., p. 182-183
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