quinta-feira, 30 de setembro de 2010
A leitura Orante da Bíblia
(LECTIO DIVINA)
Coleção TUA PALAVRA É VIDA, Loyola, 1990, CONFERENCIA DOS RELIGIOSOS DO BRASIL, (CRB).
Vamos descobrir, com a ajuda da Bíblia, que a Palavra de Deus está na nossa vida, na nossa historia, na historia da América Latina.
· HÁ VARIAS MANEIRAS DE SE OLHAR E LER A BIBLIA
Olhando de longe => A Bíblia parece uma parede imensa, onde cada tijolo faz aparecer o desenho do projeto de Deus, cada tijolo é um texto, um livro, mas de ponta a ponta transparece os traços do rosto de Deus com os traços humanos de Jesus Cristo.
Olhando mais de perto => cada tijolo é diferente do outro no tamanho, na forma, no peso, no valor, na época e no material de fabricação. Cada livro é diferente do outro no gênero literário, na língua, no autor, no assunto, na época e lugar em que foi escrito, no objetivo, etc.
Olhando bem de perto => cada tijolo, alem de contribuir para o projeto de Deus, tem seu próprio desenho, e nem sempre combina com o desenho do projeto de Deus. Os tijolos falam de outras lutas e outras historias; revelam conflitos e situações que não aparecem no grande desenho.
Olhando novamente de longe => descobre-se que não se trata de uma parede isolada, mas da parede de uma casa. Não de qualquer casa, mas sim da que você esta morando. Olhando a Bíblia você esta olhando para sua própria casa, olhando para o que é seu!
É desse modo que vamos olhar a Bíblia, ás vezes de longe, outras vezes de perto, outras bem de perto. 3 níveis ( literário – histórico – teológico), ver de perto o texto, olhar a situação do povo e escutar a mensagem de Deus.
Mas qual quer que seja o nível, o objetivo é descobrir que a palavra da Bíblia já estava pintada na parede da casa em que moramos.
CRITERIOS QUE ORIENTAM NOSSA LEITURA
3 critérios => REALIDADE, COMUNIDADE, TEXTO.
Os pobres levam consigo, para dentro da Bíblia, os problemas da sua vida. Lêem a Bíblia a partir da sua luta e da sua REALIDADE.
A leitura é feita em comunidade, é uma atividade comunitária, uma pratica orante, um ato de fé.
Se faz uma leitura obediente: respeitam o TEXTO e se colocam à escuta do que Deus tem a dizer, dispostos a mudar se Ele o exigir.
LECTIO DIVINA = leitura divina ou leitura orante => pratica de leitura da Bíblia feita pelos Cristãos para alimentar sua fé. É a leitura crente e orante da Palavra de Deus, feita a partir da fé em Jesus.
O Novo Testamento, por exemplo, é o resultado da leitura que os primeiros cristãos faziam do antigo Testamento à luz dos seus problemas e à luz da nova revelação que Deus dez através da ressurreição de Jesus, vivo no meio da comunidade.
LECTIO DIVINA vem de ORÍGENES, que diz que, para ler a Bíblia com proveito, é necessário um esforço de atenção e de assiduidade, cada dia de novo, temos que voltar à fonte da Escritura, e o que não se consegue com o próprio esforço, assim ele diz, deve ser pedido na oração, pois é absolutamente necessário rezar para poder compreender as coisas divinas.
LECTIO DIVINA = espinha dorsal da vida religiosa.
SISTEMATIZAÇÃO DA LECTIO DIVINA EM QUATRO DEGRAUS
LEITURA => é o estudo assíduo das Escrituras, feito com espírito atento.
MEDITAÇÃO => é uma diligente atividade da mente que, com ajuda da própria razão, procura o conhecimento da verdade oculta.
ORAÇÃO => é o impulso fervoroso do coração para Deus, pedindo que afaste os males e conceda as coisas boas.
CONTEMPLAÇÃO => é uma elevação da mente sobre si mesma que, suspensa em Deus, saboreia as alegrias da doçura eterna.
LECTIO DIVINA E A CONTRA REFORMA
No século XIV, ouve um longo período em que a Lectio Divina arrefeceu. A leitura da Bíblia não era fomentada, nem mesmo na vida religiosa. Era o infeliz efeito da contra reforma na vida da Igreja. O medo do protestantismo fez perder o contato com a fonte! O concilio vaticano II, porém, retomou a tradição antiga e, no seu documento Dei Verbum, recomenda com grande insistência a Lectio Divina. (DV 25).
OBJETIVO DA LECTIO DIVINA é o objetivo da própria Bíblia: comunicar a sabedoria que leva a salvação pela fé em Jesus Cristo (2Tm 3,15), instruir, refutar, corrigir, formar na justiça e, assim, qualificar o homem de Deus para toda a boa obra (2Tm 3,16-17), proporcionar perseverança, consolo e esperança (Rm 15,4), ajudar-nos a aprender dos erros dos antepassados (1Cor 10,6-10).
LECTIO DIVINA E PRINCIPIOS PRESENTES NA LEITURA CRISTÃ DA BIBLIA:
* Unidade da Escritura: a Bíblia é uma grande unidade, cada livro, cada frase tem seu lugar e sua função para nos revelar o Projeto de Deus. (parede tijolos), proíbe-se isolar os textos, arranca-los de seu contexto e repeti-los como verdades isoladas.
* Atualidade ou encarnação da Palavra: quando lemos a Bíblia, não podemos esquecer a vida, mas devemos carrega-la conosco, dentro de nós. Descobrimos que a Palavra de Deus se encarna não só naquelas épocas do passado, mas também hoje, para poder estar conosco e ajudar-nos a enfrentar os problemas e a realizar as esperanças.
* Fé em Jesus Cristo, vivo na comunidade: lemos a Bíblia a partir da nossa fé em Jesus Cristo, vivo no meio de nós. Jesus é a chave principal da leitura que fazemos.
A LECTIO DIVINA E A SIMPLICIDADE DE SEU INICIO
Método:
1.Ler e reler, cada vez mais, até conhecer bem o que está escrito; 2. repetir de memória, com a boca, o que foi lido e compreendido e rumina-lo até que da boca e da cabeça, passe para o coração e entre no ritmo da própria vida; 3. responder a Deus na oração e pedir que nos ajude a praticar o que a sua Palavra nos pede; 4. o resultado é uma nova luz nos olhos que permite saborear a Palavra e enxergar o mundo de maneira nova. Com essa luz nos olhos, começa-se, novamente, a ler, a repetir, a responder a Deus, e assim por diante... Um processo que não termina nunca, sempre volta, mas que nunca se repete tal qual.
Ora, no estudo que costumamos fazer da Bíblia, geralmente só nos preocupamos em descobrir a idéia, a mensagem da Palavra de Deus. A Lectio Divina procura atingir e ativar também as outras dimensões. Ela é mais completa. O seu resultado é mais amplo.
APROFUNDANDO OS QUATRO DEGRAUS
1. A Leitura: conhecer, respeitar, situar.
1º passo para se conhecer e amar a Palavra de Deus. Não se ama o que não se conhece.
É também o 1º passo do processo da apropriação da Palavra: ler. Ler, ler! Ler muito para familiarizar-se com a Bíblia; para que ela se torne nossa palavra, capaz de expressar nossa vida e nossa historia. Ler, pronunciar bem as palavras, se possível em voz alta. Este primeiro passo é muito importante e muito exigente. Não pode ser feito de maneira superficial, exige-se o máximo de atenção, respeito, amizade, entrega, silencio, escuta.
A leitura da Bíblia ajuda a criar em nós os olhos certos para ler a vida do povo e vice-versa.
A leitura deve ser perseverante e diária. Exige ascese e disciplina. Não pode ser interesseira, mas deve ser desinteressada, gratuita, em vista do Reino e do bem do povo.
A leitura é ponto de partida e não de chegada. Faz o leitor pisar no chão. Prepara o leitor e o texto para a meditação.
A leitura entendida como estudo crítico, ajuda o leitor a analisar o texto e a situa-lo em seu contexto de origem. Esse estudo tem três níveis:
a) Literário: aproximar-se do texto e, através de perguntas bem simples, analisar o seu tecido: quem? Onde? Por que? Quando? Como? Com que meios? Como o texto se situa dentro do contexto literário do livro de que faz parte?
b) Histórico: através do estudo do texto, atingir o contexto histórico em que surgiu o texto ou em que se deu o fato narrado pelo texto, e analisar a situação histórica em dimensões como: econômica, social, política, ideológica, afetiva, antropológica e outras. Trata-se de descobrir os conflitos que estão na origem do texto ou nele se refletem, para assim, perceber melhor a encarnação da Palavra de Deus na realidade conflitiva da historia humana, tanto deles como nossa.
c) Teológico: descobrir, através da leitura do texto, o que Deus tinha a dizer ao povo naquela situação histórica; o que Deus significava para aquele povo; como Ele se revelava; como o povo assumia e celebrava a Palavra do Senhor.
O estudo cientifico do texto não é o fim da leitura, mas um meio para se chegar ao fim.
O objetivo da leitura é furar a parede da distancia entre o ontem do texto e o hoje da nossa vida, a fim de poder iniciar o diálogo com Deus na MEDITAÇÃO.
A leitura quando bem feita ajuda a superar o fundamentalismo. Quando malfeita, faz aumenta-lo.
A leitura deve familiarizar-nos com o texto a ponto de ele se tornar nossa palavra, nesse momento, dobramos a cabeça, fazemos silencio e abrimos o ouvido: vou ouvir o que o Senhor nos tem a dizer!(Sl 85,9). É nesse momento que a leitura se transforma em meditação e que se passa para o segundo degrau da Lectio Divina.
2. A Meditação: ruminar, dialogar, atualizar.
A leitura respondeu a pergunta: o que diz o texto? A meditação vai responder a pergunta: O que diz o texto para mim, para nós hoje? O que é que Deus, através desse texto, tem a dizer hoje, aqui em MAUÁ.
A meditação indica o esforço que se faz para atualizar o texto e traze-lo para dentro do horizonte da nossa vida e realidade, tanto pessoal como social.
Como fazer a meditação?
Uma primeira forma é fazer uso da razão dialogando com o texto, com Deus, fazendo perguntas que procuram trazer o texto para dentro do horizonte da nossa vida. Medita-se refletindo, interrogando: o que há de semelhante e de diferente entre a situação do texto e a nossa hoje? Quais os conflitos de ontem que existem hoje? Quais são diferentes? O que ele quer fazer crescer em mim. Em nós? Ect.
Outra maneira de fazer a meditação é repetir o texto, rumina-lo, mastiga-lo at´r descobrir o que ele tem a nos dizer.
Pela meditação ou ruminação, a Palavra de Deus vai entrando aos poucos, vai tirando as máscaras, vai revelando e quebrando a alienação em que vivemos.
Não é fácil dizer qual o momento exato de se passar da meditação para a oração, mas existem alguns critérios. A meditação atualiza o sentido do texto até ficar claro o que Deus está pedindo de mós. Ora, quando fica claro o que Deus pede, está chegando o momento de se perguntar: E agora, o que vou dizer a Deus? Assumo ou não assumo? Quando fica claro o que Deus pede, fica clara também a nossa incapacidade e a nossa falta de recursos. É o momento da súplica, de unirmos a nossa voz ao grito do pobre e excluído, a meditação é a semente da oração. Basta pratica-la, e ela por si mesma se transforma em oração.
3. A oração: suplicar, louvar, recitar.
A atitude de oração está presente desde o começo da Lectio Divina. No inicio da leitura invoca-se o Espírito Santo. Durante a leitura sempre aparecem pequenos momentos de oração. A meditação já é quase uma atitude de oração, pois por si mesma, se transforma em prece. Entretanto, existe um momento privilegiado para a oração. É o momento de descobrir o que o texto me faz dizer, nos faz dizer a Deus!
A oração reflete o itinerário pessoal de cada um no seu caminhar em direção a Deus e no seu esforço de esvaziar-se de si para dar lugar a Deus, ao irmão, ao pobre, á comunidade.
Qual o momento de se passar da oração para a contemplação?
Não há resposta. A contemplação é o que sobra nos olhos e no coração, depois que a oração termina. A contemplação é o ultimo degrau da Lectio Divina. É o seu ponto de chegada. Cada vez, porem, que se chega ao ultimo degrau, este se torna patamar para um novo começo. Nunca se chegará ao ponto de dizer: agora realizei todo o objetivo da Palavra de Deus na minha vida, pois sempre haverá pela frente um olhar mais penetrante, uma leitura mais profunda, uma meditação mais exigente, uma oração mais engajada, uma contemplação mais transparente. Até todos os véus caírem, até que a realidade seja toda transformada e chegue à plenitude do Reino.
A contemplação não só medita a mensagem, mas também a realiza; não só ouve, mas coloca em prática. A contemplação, como ponto final da escada, é patamar para um novo começo. É como subir numa torre muito alta. Você alcança o primeiro patamar por uma escada de três lances: leitura, meditação e oração. Na janela do primeiro patamar você descansa e contempla a paisagem. Depois você continua subindo até o segundo patamar, onde faz a mesma coisa, e vê que a mesma paisagem ficou mais bonita! Da vontade de subir mais para observa-la melhor. E assim você vai subindo, sempre mais, num processo que não termina nunca, e vamos subindo até contemplar-mos Deus face a face (1Cor 13,12).
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